tag:blogger.com,1999:blog-83804822024-03-13T21:41:25.503-07:00Revendo a históriaCássio Marcelo de Melo Tuneshttp://www.blogger.com/profile/10357923622868867785noreply@blogger.comBlogger15125tag:blogger.com,1999:blog-8380482.post-82494187210954757682017-08-22T00:59:00.000-07:002017-08-22T18:50:04.576-07:00Aviso para os leitores deste blogPara os leitores deste blog:<br />
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Voltado para o Terceiro Ano do Ensino MédioCássio Marcelo de Melo Tuneshttp://www.blogger.com/profile/10357923622868867785noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8380482.post-47422316407546591672017-08-19T18:40:00.000-07:002017-08-22T18:48:55.594-07:003 série - A América Latina e a Guerra Fria (parte II)<div align="justify">
<strong>3.2 O governo Eisenhower (1953-1961)</strong><br />
O general Dwight D. Eisenhower, ex-comandante dos Aliados ocidentais na Europa durante a Segunda Guerra Mundial, foi eleito presidente dos EUA pelo Partido Republicano. No seu governo, a Guerra Fria se intensificou, sobretudo no Terceiro Mundo, onde os EUA entraram em confronto não apenas com governos ou movimentos marxistas, mas também nacionalistas, vistos como “esquerdizantes” e ameaçadores aos interesses econômicos e estratégicos americanos. A época em que Eisenhower governou os EUA coincidiu com a ascensão de <strong>Nikita Khruschev</strong> à liderança da URSS após a morte de Stalin (1953).<br />
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<strong>a) O caso da Guatemala</strong><br />
<strong>Antecedentes.</strong> País da América Central, a Guatemala foi um dos principais centros da antiga civilização dos maias, que hoje constituem 40% da população. Na primeira metade do século XX, a Guatemala desenvolveu uma economia agro-exportadora baseada em latifúndios produtores de café, cana de açúcar e banana utilizando uma mão-de-obra barata de origem indígena. Como nos demais países da América Central, esse modelo econômico tinha uma grande dependência do mercado e de capitais americanos. Politicamente, nesse período o país foi marcado por golpes de Estado e ditaduras militares respaldadas pelas elites agrárias. O governo ditatorial do general <strong>Jorge Ubico (1931-1944)</strong>, especialmente, destacou-se por algumas obras modernizadoras e por favorecer os investimentos americanos, sobretudo da poderosa empresa <strong>United Fruit Company (UFCO), </strong>que passou a controlar 40% das melhores terras do país e a exportação de banana. A UFCO também assumiu o controle do transporte ferroviário, da geração de energia, da telefonia, dos telégrafos e da principal instalação portuária do país. Em julho de 1944, em meio a uma greve geral que deixou o país paralisado, Ubico renunciou e passou o poder para um general aliado, mas a pressão popular pela liberalização do regime continuou. Em outubro, a ditadura foi finalmente derrubada por militares dissidentes que instalaram uma junta governamental, da qual fazia parte o coronel <strong>Jacobo Arbenz Guzmán</strong>, encarregada da democratização do país.<br />
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<strong>Os Dez Anos de Primavera (1944-1954).</strong> Os Dez Anos de Primavera foi um período de democracia na Guatemala, marcado por uma intensa atividade política, pelo crescimento do movimento dos trabalhadores e por expectativas de reformas. <strong>Juan José Arévalo</strong> foi o primeiro governante democrático da história do país e seu governo (1945-1951) iniciou reformas que fortaleceram os sindicatos, sobretudo a Confederação Nacional Camponesa da Guatemala ou CNCG, e tentaram obrigar os latifundiários a arrendar, a um baixo preço, suas terras não-cultivadas aos trabalhadores rurais. Essas medidas foram consideradas por demais radicais pelos grupos conservadores do país e pelos EUA (governo Truman), gerando entre eles o temor da esquerdização da Guatemala. A apreensão cresceu quando o principal candidato da direita a sucessão de Arévalo, o general Francisco Javier Arana, foi assassinado em julho de 1949. Sua morte beneficiou a candidatura do seu rival, o militar <strong>Jacobo Arbenz Guzmán</strong> que, apoiado pelas esquerdas, venceu as eleições presidenciais de 1950 com 60% dos votos. <strong>O governo de</strong> <strong>Arbenz (1951-1954),</strong> época da <strong>“Revolução Guatemalteca”,</strong> foi marcado pelo crescente confronto com os EUA, que atingiu o ápice na presidência de Eisenhower. Arbenz era um militar progressista que costuma ser classificado de “populista”. Ele não era socialista no sentido marxista, mas defendia reformas de centro-esquerda inspiradas no nacionalismo econômico, no trabalhismo e em idéias de distribuição de renda para modernizar o capitalismo, reduzir a pobreza e eliminar a dependência econômica da Guatemala em relação aos EUA. Seu governo fez uma intervenção nas ferrovias e ameaçou estatizar a geração de energia, dois setores controlados pelos americanos. Outras medidas importantes foram a legalização do partido comunista (o Partido Guatemalteco do Trabalho ou PGT), que apoiou o seu governo, e o programa de reforma agrária. Uma nova lei (o Decreto 900) deu ao governo poderes para expropriar terras improdutivas e redistribuí-las aos camponeses pobres e aos trabalhadores sem-terras, com o duplo objetivo de aumentar a produção agrícola e criar uma próspera camada de pequenos proprietários rurais. Os antigos donos expropriados seriam indenizados de acordo com o valor da terra declarado para fins tributários. Essas medidas desagradaram os latifundiários e a UFCO, que possuía muitas terras improdutivas. O governo Eisenhower considerou que Arbenz estava levando a Guatemala na direção do comunismo e da influência soviética, impressão que foi reforçada pela decisão de Arbenz de importar armas da Tchecoslováquia, um Estado satélite da URSS. A situação ficou mais complicada porque o secretário de Estado dos EUA, John F. Dulles, o seu irmão Allen W. Dulles, diretor da CIA, e a secretária pessoal de Eisenhower tinham ligações com a UFCO. A mistura de interesses econômicos americanos contrariados na Guatemala com o temor da comunização ou sovietização do país levou o governo Eisenhower a articular a derrubada de Arbenz e interromper a “Revolução Guatemalteca” em sua fase inicial, antes que fosse tarde demais.<br />
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<strong>A derrubada de Arbenz (1954).</strong> No início de 1954, Eisenhower aprovou uma covert operation (operação secreta ou dissimulada) da CIA para afastar Arbenz do governo da Guatemala, baseada em um plano mais antigo elaborado ainda na época de Truman. Sob o codinome PBSUCESS, a operação resultou na organização do “Exército de Libertação”, um grupo de 400 rebeldes guatemaltecos e mercenários financiados e armados pelos EUA em outros países da América Central. Comandado por um militar guatemalteco exilado, o coronel Carlos Castillo Armas, o Exército de Libertação invadiu a Guatemala a partir de Honduras e de El Salvador, em 18 de junho de 1954, enquanto a marinha americana lançava um bloqueio naval contra o país e uma rádio clandestina dos rebeldes transmitia informações falsas para confundir os guatemaltecos e seu governo. O exército guatemalteco, temendo uma intervenção militar direta dos EUA, não ofereceu resistência aos invasores, que na verdade constituíam uma força fraca e mal-preparada. Abandonado pelos militares, Arbenz renunciou no dia 27 de junho e, junto com 600 partidários, partiu para o exílio no México. Armas acabou assumindo o poder.<br />
Cabe observar que alguns autores chamam a derrubada de Arbenz de “Revolução Guatemalteca de 1954”, enquanto outros consideram que as medidas do governo de Arbenz em 1951-1954 é que constituíram a verdadeira “Revolução Guatemalteca”.<br />
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<strong>Significado do golpe de 1954.</strong> Os eventos de 1954 na Guatemala demonstraram a intolerância do governo Eisenhower com governos latino-americanos considerados de esquerda ou favoráveis ao comunismo, em uma época de agravamento da Guerra Fria e de sua expansão na América Latina. Por outro lado, a ameaça comunista pode ter sido propositalmente exagerada para encobrir outros interesses em jogo, como os investimentos americanos no país. De qualquer forma, Eisenhower deixou claro a sua disposição em interferir nos assuntos internos dos países da América Latina (entre outras regiões) e de apoiar a derrubada das frágeis democracias locais quando os interesses estratégicos ou econômicos dos EUA estivessem suposta ou realmente ameaçados – uma política que, em princípio, não tem nada de historicamente extraordinário, sendo típica de potências imperialistas que naturalmente zelam pela hegemonia em suas zonas de influência. De fato, o presidente Truman, antecessor de Eisenhower, já havia planejado a intervenção na Guatemala, mas abandonou o plano original depois que ele foi revelado. A intervenção americana não assumiu a forma de uma ação militar direta e unilateral, como nas épocas anteriores à Política de Boa Vizinhança. A estratégia dos EUA na Guerra Fria era de só agir militarmente de forma aberta na América Latina com o apoio da OEA, em operações multilaterais em nome de interesses coletivos, como a “segurança hemisférica”, que dariam legitimidade às intervenções. Os EUA tentaram obter esse apoio contra a Guatemala na Conferência Interamericana de Caracas (março de 1954). Nessa reunião, foi aprovada uma resolução que adaptou a Doutrina Monroe ao contexto da Guerra Fria, declarando-se que o controle comunista sobre governos ou instituições políticas dos países americanos constituiria uma ameaça ao conjunto do Hemisfério Ocidental, exigindo medidas adequadas em conformidade com o Pacto do Rio (TIAR), ou seja, prevendo uma ação armada contra um regime comunista ou favorável ao comunismo na região. Entretanto, a resolução também afirmou que só seria autorizada uma intervenção depois de uma nova reunião, o que impediu uma ação militar imediata e individual dos EUA na Guatemala, forçando-o a optar por uma operação secreta. Essa postura intervencionista dissimulada (na verdade, não tão dissimulada assim), que em geral costuma ser oficialmente negada pelo governo americano, foi mantida pelos sucessores de Eisenhower – aparentemente até tempos mais recentes, como no possível envolvimento do governo George W. Bush na tentativa de derrubada de Hugo Chávez na Venezuela, em 2002.<br />
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<strong>Conseqüências.</strong> A queda de Arbenz destruiu a nascente democracia guatemalteca. Por três décadas (1954-1985) a Guatemala viveu sob governos ditatoriais apoiados pelos EUA. A situação política se agravou a partir de 1960 com a emergência de grupos guerrilheiros esquerdistas, influenciados pela Revolução Cubana, que enfrentaram o governo, mergulhando o país em uma guerra civil de aproximadamente 35 anos (1960-1996). Em 1985, a democracia foi restaurada, mas a guerra civil só foi encerrada em 1996 com um acordo de paz entre o governo e a guerrilha. Por outro lado, a intervenção dos EUA na Guatemala foi seguida por uma onda de protestos na América Latina organizados por movimentos nacionalistas e esquerdistas, sobretudo estudantis e sindicais. O resultado foi o crescimento do anti-americanismo na região, exemplificado pela violenta recepção que o vice-presidente dos EUA, Richard Nixon, encontrou em sua famosa viagem à América do Sul em maio de 1958 – culminando em seu quase linchamento por uma multidão enfurecida nas ruas de Caracas, Venezuela.<br />
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<strong>b) O caso de Cuba<br /><br />Antecedentes (1900-1950).</strong> Cuba foi a última colônia espanhola na América Latina que ficou independente. No século XIX, os cubanos tentaram se libertar da Espanha em duas ocasiões: em 1868-1878 e em 1895-1898. A segunda tentativa precipitou a intervenção dos EUA contra os espanhóis, desencadeando a Guerra Hispano-Americana (1898). A Espanha foi derrotada e perdeu o domínio sobre Cuba, que foi ocupada pelos EUA em 1898-1902 enquanto os cubanos organizavam o seu regime político. Uma constituição foi promulgada em 1901 incorporando a famosa Emenda Platt, que dava aos americanos o direito de intervenção na ilha para preservar a ordem. Em 1902, Cuba ficou formalmente independente e os EUA retiraram suas tropas, mas conseguiram estabelecer uma base militar em Guantánamo (1903). Na prática, Cuba virou um protetorado ou “semicolônia” dos EUA, que passaram a dominar grande parte da economia do país, sobretudo o setor açucareiro (base econômica cubana e que tinha nos EUA o seu principal mercado consumidor). Tropas americanas intervieram na ilha em 1906-1909, 1912 e 1917-1922. Em 1934, de acordo com a Política de Boa Vizinhança de Franklin Roosevelt, a Emenda Platt foi revogada, mas os americanos continuaram dominando a economia cubana e preservaram a base em Guantánamo. Entre 1933 e 1959, a política em Cuba foi marcada pela figura do militar <strong>Fulgêncio Batista</strong>, que governou oficialmente o país em 1940-1944 e em 1952-1959. O seu primeiro governo foi democrático, baseado na Constituição de 1940 (muito avançada em termos de garantias de direitos sociais), e contou com o apoio e participação dos comunistas. Reformas sociais foram feitas em um contexto de prosperidade econômica. Mas em 1952-1959, Batista governou como um ditador, sem o apoio dos comunistas. Nessa época, Cuba tinha se transformado em um dos países mais ricos da América Latina, com a segunda maior renda per capita da região (só perdia para a Venezuela, que era beneficiada pelo petróleo) e um dos melhores índices de saúde, educação e expectativa de vida do Hemisfério Ocidental. Entretanto, esses indicadores socioeconômicos eram mais positivos nas cidades do que no meio rural e Cuba não era de forma alguma um país “desenvolvido”. Havia uma grande concentração de renda nas mãos da elite partidária do regime de Batista, a pobreza ainda era considerável e o país continuava muito dependente da exportação de açúcar para os EUA e de investimentos americanos. Além disso, a década de 1950 foi marcada pelo crescimento dos negócios de turismo, do jogo e da prostituição nos centros urbanos, em geral envolvendo mafiosos americanos. Um sentimento de humilhação nacional diante da degradação moral e da submissão aos EUA (real ou aparente) espalhou-se entre parte da população, principalmente os estudantes e intelectuais da classe média, setores da elite econômica excluídos das benesses do regime e os trabalhadores mais pobres. O ressentimento nacionalista foi reforçado pela insatisfação com a corrupção, o autoritarismo e a repressão. Foi no contexto da ditadura de Batista, contemporânea em sua maior parte do governo de Eisenhower, que eclodiu a Revolução Cubana.<br />
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<strong>A Revolução Cubana (1953-1959).</strong> A Revolução Cubana foi um movimento ideológica e politicamente heterogêneo, reunindo diversos grupos rivais de esquerdistas, nacionalistas e liberais que tinham em comum o objetivo de derrubar Batista, democratizar e moralizar o país e fazer reformas. Entre os revolucionários, destacou-se o grupo liderado pelo jovem e carismático advogado <strong>Fidel Castro</strong>. Em 26 de julho de 1953, Castro liderou um ataque mal-sucedido ao quartel de Moncada, em Santiago de Cuba, na região oriental do país. Parte dos revolucionários morreu nessa ação e Castro foi preso. Libertado em 1955 por um decreto de anistia política, ele foi para o México e reorganizou o seu grupo, que adotou o nome de <strong>Movimento 26 de Julho (M-26-7). </strong>Ainda no México, o grupo castrista recebeu a adesão do médico argentino <strong>Ernesto “Che” Guevara</strong>, que tinha vivido na Guatemala na época da queda de Arbenz, uma experiência decisiva para a sua radicalização política e o seu antiamericanismo. Em dezembro de 1956, o M-26-7, com cerca de 80 homens, desembarcou em Cuba e iniciou uma guerrilha contra Batista, concentrando suas ações na Sierra Maestra, sob a liderança de Fidel, seu irmão Raul Castro, Che Guevara e Camilo Cienfuegos. Paralelamente, a oposição a Batista cresceu entre vários setores da sociedade cubana, sobretudo junto aos estudantes, intelectuais e sindicatos. Os comunistas, que tinham uma grande influência no movimento sindical, mas que inicialmente relutaram em apoiar a luta armada, aceitaram ajudar o M-26-7 no início de 1958. A revolução cubana, entretanto, não assumiu um caráter tipicamente socialista, ao menos no sentido “marxista-leninista”, e o PSP (Partido Socialista Popular, nome do partido comunista cubano) era apenas uma das forças anti-Batista, assim mesmo com uma posição muito ambígua e hesitante em relação a Fidel Castro. Isso não significa que idéias socialistas não circulassem entre os guerrilheiros castristas. Raul Castro e Che Guevara eram simpáticos ao comunismo e o próprio Fidel defendia reformas sociais e econômicas coletivistas que não eram radicalmente diferentes das medidas estatizantes propostas pela tradição socialista (reforma agrária, intervenção governamental na economia). O M-26-7 era certamente uma organização esquerdista, mas de linha mais nacionalista do que marxista ortodoxa e independente do partido comunista, dos seus dogmas e do controle soviético – uma posição que deixou inicialmente o governo de Eisenhower confuso sobre as reais intenções do grupo castrista. Em 1958, a violência política cresceu no país aumentando a insegurança para os negócios americanos. Como o movimento revolucionário incluía grupos liberais partidários da manutenção dos laços econômicos com os EUA, Eisenhower não considerou a luta contra Batista uma ameaça muito grande aos interesses americanos, embora não tivesse certeza absoluta quanto a isso. Inicialmente, Eisenhower apoiou Batista, mas com o aumento da instabilidade política e os problemas econômicos, o governo americano passou a considerar que apenas com o fim da ditadura Cuba voltaria à normalidade. Consequentemente, os EUA passaram a pressionar Batista para que renunciasse, mas o ditador cubano resistiu. Em março de 1958, o governo americano suspendeu o fornecimento de armas a Batista (mas não impediu que ele importasse material bélico da Grã-Bretanha e da Iugoslávia). Em abril do mesmo ano, uma greve geral foi desencadeada com pouco sucesso. Porém, a guerrilha do M-26-7 continuou suas ações e, em maio-junho, derrotou uma grande ofensiva do exército. Nos meses seguintes as forças guerrilheiras avançaram e a situação de Batista ficou insustentável. Em 1 de janeiro, Batista renunciou e fugiu do país. A revolução triunfou, abrindo caminho para que o grupo de Fidel Castro assumisse o poder.<br />
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<strong>O início do regime revolucionário (1959-1960).</strong> Os EUA viram com apreensão a vitória da Revolução Cubana, mas estavam de certa forma conformados com a sua inevitabilidade. A Casa Branca não tinha nenhuma simpatia por Fidel Castro, de quem desconfiava por suas posições esquerdistas, e esperava que um grupo mais moderado assumisse a direção do país, afastando a influência dos comunistas ortodoxos (PSP) e dos não-ortodoxos e independentes (M-26-7). De fato, em um primeiro e curto momento, a coalizão revolucionária foi mantida e o poder executivo foi assumido por dois liberais, com Manuel Urrutia na presidência (janeiro-julho) e José Miró Cardona como primeiro-ministro (janeiro-fevereiro). Os EUA ficaram mais tranqüilizados e reconheceram o novo governo. Entretanto, quem de fato detinha o poder era Fidel Castro, que adquiriu o título de Comandante-em-Chefe Militar e, junto com os demais líderes guerrilheiros, assumiu o controle das forças armadas, expurgando de suas fileiras os elementos pró-Batista. A posição do M-26-7 se fortaleceu em fevereiro, quando Miró renunciou e Fidel assumiu o cargo de primeiro-ministro. Entre as primeiras medidas do governo da coalizão revolucionária destacaram-se as de cunho moralizante (fechamento de bordéis e cassinos), econômico emergencial (controle de preços e intervenções em empresas estrangeiras) e de “justiça revolucionária” ou, simplesmente, vingança (prisão, julgamento e execução dos antigos colaboradores de Batista). Muitos “batistianos” fugiram para os EUA, onde formaram uma comunidade de exilados que tentou convencer o governo Eisenhower a agir contra o regime revolucionário. A Casa Branca, entretanto, não sabia ao certo o que fazer. A situação política em Cuba ainda não estava claramente definida e havia esperança de que os liberais conseguissem prevalecer, ou que o próprio Fidel optasse por uma postura mais moderada. A medida mais extrema – uma intervenção militar – era politicamente inviável naquele momento: não havia ainda nenhum pretexto que a justificasse ou o apoio da OEA e, pior, poderia reforçar o crescente antiamericanismo revelado na desastrosa viagem do vice-presidente Nixon à América do Sul em 1958 (episódio que abalou Eisenhower). Em abril, Fidel viajou aos EUA, mas Eisenhower não quis recebê-lo (encontrou-se com Nixon, que não teve boa impressão do novo dirigente cubano).<br />
A situação se deteriorou rapidamente nos meses seguintes com a ruptura da aliança revolucionária por causa das divergências quanto aos rumos da revolução (principalmente a respeito da reforma agrária proposta pelos esquerdistas) e a oposição dos moderados a crescente influência comunista no novo regime. Em maio de 1959, foi aprovada a Lei de Reforma Agrária, que limitava o tamanho das propriedades rurais, expropriava as áreas cultiváveis excedentes e previa a exclusão de não-cubanos do direito de possuir terras. A lei não apenas atingiu os interesses dos latifundiários cubanos como, obviamente, ameaçou as propriedades de cidadãos americanos na ilha. A indenização oferecida pelo governo cubano foi considerada insuficiente pelas empresas americanas donas de terras (sobretudo a UFCO), que a rejeitaram. Em julho, o presidente Urrutia renunciou pressionado por Fidel e por setores populares mobilizados contra ele. Osvaldo Dorticós, um fiel aliado de Castro, assumiu a presidência de Cuba, com um poder mais simbólico do que real. A insatisfação com o controle esquerdista do governo, que caminhava para se transformar em uma ditadura revolucionária, cresceu entre os liberais, em sua maioria membros da elite econômica e da classe média que haviam feito oposição política a Batista, mas que não queriam uma alteração profunda nas estruturas econômicas e sociais de Cuba, nem a instalação de um outro regime autoritário. Esses grupos moderados, inseguros quanto ao futuro da revolução, também começaram a fugir em massa do país (40 mil pessoas em 1959-1960), engrossando as fileiras dos exilados nos EUA e reforçando a propaganda anticastrista.<br />
A tensão entre os governos de Fidel e de Eisenhower cresceu no segundo semestre de 1959 e foi agravada em 1960 pela aproximação Cuba-URSS – um fato que não havia acontecido na Revolução Guatemalteca e que estava transformando Cuba em um caso muito mais perigoso para os EUA. A URSS reconheceu o novo governo de Havana em janeiro de 1959, mas foi somente em junho-julho que os dois governos iniciaram conversações por ocasião de uma viagem de Che Guevara ao exterior. Em fevereiro de 1960, os soviéticos assinaram acordos com os cubanos para a compra de açúcar e o fornecimento de ajuda econômica e de petróleo. Nessa altura, a CIA já havia apresentado a Eisenhower um plano para inviabilizar o regime revolucionário cubano prevendo a sabotagem das refinarias de açúcar da ilha. Eisenhower achou essa primeira covert operation muito ineficiente e, em março, autorizou que a CIA elaborasse um outro plano para derrubar Castro utilizando exilados cubanos, semelhante à operação da Guatemala contra Arbenz. No mesmo mês, Fidel rompeu com o TIAR e nos meses seguintes recebeu armas do bloco socialista, desafiando o embargo mantido pelos EUA desde 1958. Em abril, o petróleo importado da URSS começou a chegar, mas as refinarias americanas em Cuba, orientadas pelo governo Eisenhower, recusaram a refiná-lo. Fidel reagiu estatizando as refinarias em junho. Em julho, os EUA cortaram a importação de açúcar, mas a URSS e a China comunista foram em auxílio e ofereceram-se para comprar a produção não vendida. Na crescente disputa mundial entre as superpotências da Guerra Fria, Khruschev tinha decidido enfrentar os EUA em uma área sagrada para os americanos – o Hemisfério Ocidental, particularmente o Caribe. Da mesma forma que os EUA e seus aliados ocidentais insistiam em manter o controle sobre Berlim Ocidental, simbolizando a resistência anticomunista em uma região de influência soviética, a URSS ajudaria a criar um reduto antiamericano, se possível socialista, próximo dos EUA, desafiando sua hegemonia hemisférica. Os acontecimentos em Cuba ofereciam uma oportunidade única, que Khruschev não quis perder. De forma extraordinária e ousada, o dirigente soviético chegou a declarar que a Doutrina Monroe tinha morrido e que a URSS não reconheceria mais a hegemonia dos EUA nas Américas.<br />
No segundo semestre de 1960 as relações EUA-Cuba se deterioraram completamente. Em represália ao corte da compra de açúcar pelos EUA, o governo cubano decretou, entre agosto e dezembro, a nacionalização do patrimônio americano na ilha (terras, engenhos, bancos, empresas de comunicações, energia, ferrovias, hotéis, instalações portuárias), ampliando o processo de estatização da economia. Em 2 de setembro de 1960, Fidel fez um discurso conhecido como <em>A Primeira Declaração de Havana</em>, em que denunciou o imperialismo americano, justificou a Revolução Cubana como uma das lutas de libertação latino-americana e sugeriu que o regime revolucionário de Cuba ajudaria os povos da América Latina a se libertaram da dominação dos EUA. Naquele mês, Fidel foi à Nova York discursar na ONU e provocou os conservadores americanos hospedando-se em um hotel no Harlem, tradicional bairro negro, onde foi visitado por Khruschev. Eisenhower reagiu decretando, em 19 de outubro, um <strong>embargo comercial parcial</strong>: as exportações americanas para Cuba estavam suspensas, excetos medicamentos e alguns alimentos. Essa medida levou o regime cubano a se aproximar mais ainda da URSS em busca de auxílio econômico e militar. Nessa altura, Eisenhower estava no final do seu mandato e resolveu deixar para o sucessor (John Kennedy, eleito em novembro) a resolução do problema cubano. Suas últimas medidas de peso nessa questão, antes de transferir o cargo, foram a suspensão total da importação de açúcar cubano (dezembro de 1960) e a ruptura de relações diplomáticas com Cuba (janeiro de 1961).<br />
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<strong>3.3 O governo Kennedy (1961-1963)</strong><br />
O senador de Massachusetts, John F. Kennedy, foi eleito presidente dos EUA pelo Partido Democrata – o mais jovem político americano a ocupar o cargo (tinha 43 anos na posse). O seu governo foi marcado por duas das maiores crises da Guerra Fria (de Berlim em 1961 e de Cuba em 1962) e pela intensificação do confronto com o comunismo no Sudeste Asiático, que resultou em um maior envolvimento militar americano no conflito do Vietnã. Por outro lado, Kennedy buscou reforçar os laços entre os EUA e a América Latina com um grande programa de ajuda econômica aos países latino-americanos. Na época de Kennedy, a URSS continuou dirigida por Khruschev, que estava no ápice do seu poder.<br />
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<strong>(a) O agravamento da Questão Cubana</strong><br />
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A “Questão Cubana” – os problemas e incertezas sobre o futuro das relações entre o regime revolucionário antiamericano de Cuba e os EUA – foi um dos principais legados de Eisenhower para Kennedy que, durante a campanha eleitoral, havia criticado o seu antecessor por não ter agido com dureza contra Fidel Castro. De fato, em 1959-1960, os EUA perderam o domínio sobre Cuba, que caminhava rapidamente na direção do socialismo com crescente auxílio e influência da URSS. Em 1961-1963, na época de Kennedy, esse processo se completou e Cuba passou a ser o único país comunista do Hemisfério Ocidental e um importante aliado dos soviéticos na Guerra Fria.<br />
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<strong>A invasão da Baía dos Porcos (1961).</strong> Ao assumir a presidência, Kennedy foi informado do plano da CIA para derrubar Fidel Castro utilizando-se de uma força de 1400 exilados cubanos e mercenários (a Brigada 2506) financiados, armados e treinados pelos EUA na Guatemala e comandados por ex-oficiais do exército de Batista. O plano original previa que os exilados invadiriam Cuba com apoio aéreo americano. A notícia da invasão, pensava-se, despertaria uma revolta popular contra Fidel. Kennedy aprovou o plano, mas fez algumas modificações. A mais importante foi cancelar a participação militar americana direta (o apoio aéreo) para dar a impressão de que a invasão era integralmente “cubana” e não uma intervenção dos EUA, legitimando toda a operação. Essa decisão contribuiu para o fracasso da invasão que, de uma maneira geral, foi mal preparada. Além disso, Fidel foi previamente informado da operação pelo serviço de inteligência soviético. Em 15 de abril, a aviação rebelde, partindo da Nicarágua, atacou aeroportos em Cuba, precipitando medidas repressoras de Fidel contra os opositores, reais ou não. Nos dias seguintes, 100 mil suspeitos de apoiar os invasores foram detidos, entre eles todos os bispos e muitos jornalistas, o que praticamente eliminou as chances de uma revolta contra o regime. No dia 16 de abril, véspera da invasão, Fidel deixou clara a sua posição declarando em um comício que a revolução cubana era socialista. A invasão propriamente dita começou no dia 17 de abril na Baía dos Porcos, na costa centro-sul da ilha, e desde o início foi um desastre. Os invasores possuíam poucos aviões de combate (que para piorar eram antiquados) e suas forças terrestres eram numericamente inferiores aos efetivos do exército revolucionário, reforçado pelas milícias populares organizadas pelo regime – no total mais de 50 mil combatentes. Fidel Castro realmente era odiado por parte dos cubanos, mas seu governo também tinha o respaldo de outra parte da população, sobretudo dos trabalhadores pobres e dos grupos nacionalistas, o que dificultava uma sublevação. Os exilados foram contidos na praia de desembarque e nenhuma revolta ocorreu. No dia 19 de abril, a operação anticastrista terminou em total fiasco. Mais de 100 invasores morreram e 1200 foram capturados (a maioria seria libertada em dezembro de 1962, trocada por alimentos e remédios dos EUA). As baixas cubanas foram estimadas entre 2000 e 5000, a maior parte vítima dos bombardeios aéreos da aviação dos exilados. Apesar das restrições de Kennedy quanto à participação direta dos EUA, o envolvimento americano foi óbvio em toda a operação. A invasão da Baía dos Porcos só serviu para radicalizar o nacionalismo popular cubano e aumentar o apoio interno ao regime de Fidel Castro. O antiamericanismo cresceu em Cuba, na América Latina e várias partes do mundo. O governo dos guerrilheiros cubanos adquiriu mais fama e apoio internacional junto aos movimentos de esquerda, demonstrando ser possível a um pequeno país enfrentar com sucesso o imperialismo de uma superpotência, como um Davi enfrentando um Golias. Na euforia do momento, passou despercebido que os EUA efetivamente não utilizaram o seu enorme poderio militar contra Cuba, mas apenas apoiaram de maneira incompetente e irresponsável uma pequena força mal preparada de invasores. O episódio da invasão fracassada também serviu de pretexto para Fidel Castro aumentar a repressão em Cuba e fortalecer o seu poder, além de acelerar a aproximação cubano-sovética. Em julho de 1961, o M-26-7 fundiu-se com o PSP para formar as Organizações Revolucionárias Integradas ou ORI; em dezembro de 1961, Fidel anunciou que era um seguidor do marxismo-leninismo e, em março de 1962, a ORI virou o Partido Unido da Revolução Socialista Cubana ou PURSC (em 1965 mudou o nome para Partido Comunista de Cuba), com o monopólio do poder político. O crescimento da repressão e o avanço do comunismo em Cuba, por sua vez, aumentou a fuga de cubanos do país (80 mil pessoas em 1961)<br />
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<strong>O embargo comercial e a Operação Mangusto (1961-1962).</strong> Apesar do fracasso humilhante da invasão da Baía dos Porcos, o governo Kennedy continuou tentando derrubar Fidel Castro. Em novembro de 1961, ele autorizou um outro plano para desestabilizar o regime cubano – a Operação Mangusto ou “Projeto Cubano”. Iniciada em março de 1962, a Operação Mangusto empregou diversos meios (sabotagens, infiltração de agentes e tentativas de assassinatos de autoridades) para gerar o caos em Cuba e, esperava-se, causar uma revolta popular contra Fidel por volta de outubro. Antes da Operação Mangusto entrar em ação, os EUA buscaram isolar Cuba no front diplomático e econômico. Em janeiro de 1962, sob pressão do governo americano, <strong>a OEA expulsou Cuba da organização</strong> (o Brasil se absteve na votação da resolução) e, em fevereiro, Kennedy decretou <strong>o embargo econômico total dos EUA contra Cuba</strong> (a OEA aderiu ao embargo em 1964, mas suspendeu-o em 1975). No mesmo mês, Fidel lançou a <em>Segunda Declaração de Havana</em>, apelando aos revolucionários da América Latina para que agissem contra os regimes da região e o imperialismo americano.<br />
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<strong>A crise dos mísseis (1962).</strong> Para Fidel Castro e Khrushchev, a derrota dos exilados cubanos na Baía dos Porcos não havia eliminado a ameaça de uma intervenção militar americana em Cuba. Ao contrário, a vitória do regime revolucionário e a transformação de Cuba em um país socialista aliado da URSS reforçavam a possibilidade de que os EUA agiriam militarmente para recuperar o controle sobre a ilha e o prestígio internacional americano. A guerra econômica intensificada por Kennedy, as ações da Operação Mangusto e o isolamento de Cuba no Hemisfério Ocidental pareciam indicar que os EUA estavam preparando uma invasão. Na verdade, Kennedy tinha desistido de invadir Cuba em 1962, embora não descartasse fazer isso no futuro. Khrushchev, por sua vez, considerava prioridade defender Cuba e ampliar a influência soviética sobre a ilha por razões ideológicas e estratégicas. A adesão de Cuba ao comunismo como aliada de Moscou tinha um forte simbolismo e causava um grande impacto psicológico, demonstrando a impotência americana em controlar os acontecimentos na sua tradicional esfera de domínio e a capacidade da URSS de projetar internacionalmente a sua influência no mundo. Para Khrushchev, isso compensava a humilhação de ter que aceitar o controle americano, britânico e francês de Berlim Ocidental, além de reforçar a liderança soviética no bloco socialista no momento em que ocorria a ruptura entre a URSS e a China comunista (outubro 1961). Além disso, por sua posição geográfica (150 km da costa da Flórida), Cuba dava aos soviéticos uma oportunidade única para reduzir ou mesmo eliminar a superioridade dos EUA em armamentos nucleares. Essa superioridade fora ampliada quando, em 1961, depois de uma longa negociação, os EUA convenceram a Turquia, país fronteiriço com a URSS, a aceitar a instalação de mísseis nucleares Júpiter em seu território. Os mísseis ficaram operacionais no início de 1962 e, embora sua tecnologia tenha ficado obsoleta, deixaram a URSS mais vulnerável no caso de uma guerra contra os EUA. Khrushchev protestou inutilmente contra os “mísseis turcos”. Contudo, o estabelecimento de bases de mísseis nucleares americanos em um país vizinho da URSS abriu um precedente para os soviéticos fazerem o mesmo em relação aos EUA.<br />
Em maio de 1962, Fidel Castro e Khrushchev decidiram pela instalação em Cuba, de 36 MRBM (medim-range ballistic missiles ou mísseis balísticos de médio alcance de modelo R-12 ou SS-4 Sandal, com alcance de 1600 km) e 24 IRBM (intermediate-range ballistic missiles ou mísseis balísticos de alcance intermediário do tipo R-14 ou SS-5 Skean, com alcance de 4000 km). Sob o nome de <strong>Operação Anadyr</strong>, o plano envolvia também o envio de bombardeiros IL-28, caças MiG-21, baterias de mísseis antiaéreos e 60 mil tropas para a ilha caribenha, na maior mobilização militar ultramarina da história soviética. A Operação Anadyr seria complementada pela <strong>Operação Kama</strong> – a construção de uma base para o estacionamento de 11 submarinos lançadores de mísseis nucleares. Por insistência de Khrushchev, todas as operações seriam feitas em segredo. Os armamentos e soldados começaram a chegar em junho e, no início de outubro, a base naval começou a ser construída. Paralelamente, o regime cubano ampliou e modernizou as suas forças armadas de 40 mil homens, reforçadas por 300 mil milicianos.<br />
Desde o início, os EUA perceberam que uma grande operação militar estava sendo montada em Cuba. Em julho, o serviço de inteligência da França chegou a alertar a CIA de que a URSS estava instalando mísseis em território cubano, mas o governo americano não acreditou. No final de agosto, aviões americanos fotografaram lançadores de mísseis de defesa antiaérea. No dia 4 de setembro, Kennedy afirmou para o Congresso americano que não havia indícios da existência de mísseis nucleares em Cuba. No mesmo dia, o embaixador soviético em Washington confirmou que os mísseis em Cuba eram defensivos e que não havia motivo de alarme. No entanto, no dia 8 de setembro os primeiros mísseis nucleares chegaram a Cuba. No dia 11, o governo soviético comunicou que a URSS não possuía armas nucleares fora do seu território e Khrushchev assegurou pessoalmente ao presidente americano que não pretendia instalar armamentos ofensivos na ilha caribenha. A verdade foi revelada no dia 14 de outubro, quando um avião americano U-2 de reconhecimento descobriu e fotografou os lançadores de mísseis SS-4. No dia 16, Kennedy viu as fotos e organizou um Comitê de Segurança Nacional para analisar o fato e propor medidas imediatas. Era o início da <strong>Crise dos Mísseis Cubanos</strong>, chamada também de <strong>Crise de Outubro</strong> ou <strong>Crise Caribenha</strong> – 13 dias de confronto entre os EUA e a URSS (junto com Cuba), no episódio mais tenso da Guerra Fria, quando as duas superpotências estiveram próximas de um conflito militar de conseqüências imprevisíveis.<br />
No dia 18 de outubro, Kennedy encontrou-se com o ministro das relações exteriores da URSS, Andrei Gromyko, que, desconhecendo que o presidente americano já sabia da existência dos mísseis, reafirmou que não havia armas ofensivas soviéticas em Cuba. No dia seguinte, os americanos descobriram que pelo menos quatro lançadores de mísseis eram operacionais. A insistência soviética em mentir sobre o assunto e caráter secreto da instalação dos mísseis (ao contrário dos similares americanos na Turquia, que foram instalados abertamente) pareciam indicar que a URSS planejava algum ataque surpresa contra os EUA. Mesmo que os soviéticos pensassem em revelar a existência do arsenal nuclear no Caribe depois que ele estivesse totalmente instalado, era uma situação não só militar como politicamente inaceitável para os EUA: tolerar os mísseis seria um sinal de fraqueza americana, com implicações gravíssimas para a liderança do país nas Américas e no bloco capitalista de uma maneira geral.<br />
Os militares americanos pressionaram Kennedy para que ordenasse um ataque aéreo a Cuba, preferencialmente seguido de invasão. Embora não descartasse totalmente essa possibilidade, ele optou primeiro por um <strong>bloqueio naval da ilha</strong>, oficialmente chamado de “quarentena”: a marinha americana cercaria Cuba e impediria a chegada de navios carregando equipamentos militares. Os navios só seriam autorizados a passar pelo bloqueio depois de inspecionados e a quarentena só seria suspensa se a URSS assegurasse que iria retirar os mísseis imediatamente.<br />
No dia 22 de outubro, Kennedy fez um pronunciamento na televisão anunciando a descoberta dos mísseis e a imposição do bloqueio naval. No dia 23, a OEA apoiou a medida. No mesmo dia, Khrushchev afirmou que o bloqueio era ilegal e que não iria respeitá-lo. No dia 24, o bloqueio começou a ser aplicado. Nessa altura, já tinham chegado a Cuba 42 mísseis, acompanhados por 47 mil soldados soviéticos, embora apenas 9 foguetes estivessem plenamente operacionais. Os navios que rumavam para Cuba acabaram se desviando (um navio-tanque conseguiu furar o bloqueio no dia 25). A quarentena deixou Cuba isolada, mas a URSS não parecia disposta a retirar os mísseis. A situação piorou no dia 26 quando, diante do impasse, Kennedy deu sinais de que considerava ser necessário invadir a ilha para destruir os mísseis. No mesmo dia, Fidel Castro tentou convencer Khrushchev a atacar os EUA. No dia seguinte, um avião americano foi derrubado sobre Cuba e outro atingido pelo fogo antiaéreo.<br />
No entanto, paralelamente a escalada da crise, Kennedy e Khrushchev, continuaram mantendo contatos formais (telegramas, embaixadores) e informais (pronunciamentos em rádio, intermediação de outros países e da ONU) buscando uma solução negociada. O agravamento do confronto nos dias 26-27 e o temor de uma guerra que não interessava aos dois dirigentes forçaram o estabelecimento do <strong>Acordo Kennedy-Khrushchev</strong>, no dia 28 de outubro, encerrando a crise: os EUA suspenderiam o bloqueio naval e a URSS retiraria seus mísseis, bombardeiros e a maior parte das tropas soviéticas de Cuba. Essas decisões foram públicas, porém o acordo envolvia secretamente outras duas contrapartidas dos EUA: eles retirariam os seus mísseis da Turquia alguns meses depois e se comprometeriam em não invadir Cuba, desde que o regime de Fidel Castro não ameaçasse diretamente a segurança nacional americana. Como o compromisso soviético foi público e o americano secreto, aparentemente somente a URSS é que havia cedido, parecendo que Kennedy tinha triunfado completamente sobre Khrushchev e Fidel.<br />
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<strong>Conseqüências do Acordo Kennedy-Khrushchev.</strong> O acordo evitou uma guerra nuclear, mas gerou descontentamento nos dois lados. Pelo menos uma parte dos militares americanos ficou insatisfeita, por considerar que os EUA cederam demais e perderam a oportunidade de destruir o regime comunista cubano. O recuo de Khrushchev também foi criticado por membros do Partido Comunista da URSS, que o consideraram humilhante, além de não ter resolvido a questão de Berlim Ocidental. Fidel Castro também condenou o acordo, sobretudo por não ter sido consultado, e pelo fato da negociação não envolver a retirada americana de Guantánamo. No entanto, a solução da crise foi muito favorável ao seu governo, que conseguiu escapar de uma invasão americana e sobreviver como o único regime comunista da América.<br />
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<strong>A sobrevivência do socialismo cubano e suas conseqüências.</strong> Como os demais países socialistas, Cuba adotou um modelo político e econômico caracterizado pela ditadura monopartidária (do partido comunista) em nome dos trabalhadores e pela estatização dos meios de produção e dos serviços. Foram feitos grandes investimentos na educação e saúde públicas que, além de terem a sua qualidade melhorada, beneficiaram um número maior de cidadãos, transformando-se nas principais “vitrines” do regime de Fidel Castro. Contudo, o país continuou possuindo uma economia agrária dependente da exportação de açúcar e do auxílio financeiro estrangeiro, particularmente da URSS. Apesar do desenvolvimento econômico limitado, da forte repressão política e da censura, uma parte expressiva da população apoiou o regime por causa dos ganhos sociais, do carisma de Fidel Castro e do sentimento nacionalista que se confundia com ideais socialistas e antiamericanos. Esse nacionalismo era reforçado pela crença de que os cubanos haviam derrotado o imperialismo americano em 1959-1962 e o derrotariam novamente no futuro, desde que mantivessem uma forte união em torno do regime revolucionário e do seu líder supremo. Muitos cubanos, no entanto, sobretudo das antigas elites econômicas e da classe média, não tinham essa avaliação. Eles odiavam o comunismo por ele combinar a repressão política, a intolerância ideológica, a eliminação da propriedade privada e a supressão da liberdade econômica individual, em um quadro de redução drástica do padrão de vida (dos ricos e da classe média) pelo nivelamento “por baixo”, resultado de medidas igualitárias e coletivistas que visavam beneficiar os segmentos mais pobres da sociedade cubana. Nesse contexto, 70 mil cubanos fugiram para os EUA em 1962. No total, entre 1959 e 1962, 190 mil pessoas fugiram de Cuba, que tinha 6 milhões de habitantes. Em 1965-1971, outros 250 mil cubanos fugiram do país. No final da década de 1980, o número de refugiados cubanos nos EUA aproximou-se de um milhão, cerca de 10% da população de Cuba.<br />
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<strong>A internacionalização da Revolução Cubana.</strong> A consolidação do regime de Fidel Castro em Cuba, com suas características socialistas, nacionalistas e antiamericanas – um conjunto de elementos que seus partidários classificaram de “antiimperialistas” – naturalmente teve um grande impacto na América Latina durante a Guerra Fria, exercendo uma forte influência sobre as esquerdas da região e de outras partes do Terceiro Mundo, como a África. Com efeito, Cuba estimulou, muitas vezes de forma direta, os movimentos revolucionários latino-americanos e africanos de um jeito que nem mesmo a URSS havia feito. Um dos principais defensores da “exportação” ou internacionalização da Revolução Cubana na década de 1960 foi <strong>Che Guevara</strong>. Suas idéias inspiraram o desenvolvimento de um modelo revolucionário baseado na <strong>“teoria do</strong> <strong>foco”</strong> ou <strong>“foquismo”:</strong> a guerrilha de base rural, estabelecida a partir de um pequeno grupo ou “foco” de guerrilheiros profissionais e dedicados que, gradualmente, ganhariam o apoio dos camponeses, ampliando o número de combatentes até gerar um movimento popular que levaria a derrubada de um regime. Embora o modelo original destacasse a revolução no meio rural com apoio camponês, essa teoria foi adaptada para a luta revolucionária nas grandes cidades – a guerrilha urbana. Essas idéias de luta armada são herdeiras de uma tradição revolucionária mais antiga na América Latina, anterior a penetração do marxismo na região. O que a Revolução Cubana fez foi combinar essa tradição com as idéias marxistas, dando uma outra dimensão aos movimentos revolucionários e aos seus objetivos. Ao contrário do que se costuma supor, essas idéias não tiveram apoio unânime dos partidos comunistas latino-americanos, que ficaram, na verdade, rachados quanto a melhor tática a ser empregada em prol da revolução socialista a curto, médio ou longo prazo (guerrilha rural ou urbana, aliança com grupos nacionalistas, infiltração do movimento operário, influência cultural no sistema educacional e na mídia etc). Essas divergências sobre os métodos revolucionários, no entanto, não impediram que as diversas correntes da esquerda latino-americana apoiassem o comunismo cubano e buscassem inspiração ou algum tipo de ajuda junto ao regime de Fidel Castro. De qualquer forma, é possível que 2 mil latino-americanos tenham sido treinados nas técnicas de guerrilha em Cuba na década de 60.<br />
Na verdade, na maior parte dos casos, a luta armada influenciada ou apoiada por Cuba fracassou. Em 1962-1963, o governo cubano ajudou na organização de um grupo guerrilheiro na <strong>Argentina</strong> que foi rapidamente destruído. Em 1963-1967, outro grupo maior foi organizado na <strong>Venezuela</strong>, mas também foi mal-sucedido. Em 1965, Che Guevara e uma centena de guerrilheiros negros cubanos foram enviados ao <strong>Zaire </strong>(Congo belga), na África Central, para ajudar rebeldes marxistas na guerra civil congolesa, sem sucesso. Em 1966, o governo cubano patrocinou a criação da <strong>OLAS (Organização Latino-Americana de Solidariedade)</strong> com o objetivo de cooperar com os grupos revolucionários da América Latina. Em 1966-1967, Che Guevara e um pequeno grupo de cubanos tentou organizar uma guerrilha na <strong>Bolívia</strong>. A expedição revolucionária fracassou e Che foi capturado e morto pelas forças bolivianas (outubro, 1967). O maior envolvimento cubano no exterior foi em Angola, antiga colônia portuguesa na África, que ficou independente em 1975. O país ficou mergulhado na guerra civil entre o governo marxista do MPLA (Movimento Pela Libertação de Angola), encabeçado por Agostinho Neto, e grupos rivais (FNLA ou Frente Nacional Pela Libertação de Angola e UNITA ou União Nacional Pela Independência Total de Angola) apoiados pela África do Sul e os EUA. A URSS e Cuba, por sua vez, apoiaram o governo angolano. A ajuda militar de Havana foi decisiva para a sobrevivência do MPLA: mais de 60 mil soldados cubanos foram enviados a Angola em 1975-1991, participando de vários combates contra as tropas sul-africanas. A segunda maior participação de Cuba em um conflito internacional foi também em outro país africano, a <strong>Etiópia</strong>: 24 mil soldados cubanos foram enviados para o país em 1977-1979 durante a guerra contra a vizinha Somália.<br />
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<strong>(b) A Aliança Para o Progresso (1961) </strong>Aliança Para o Progresso foi o nome do programa de ajuda econômica dos EUA aos países da América Latina na década de 1960. Desde o final dos anos 40, cogitava-se a possibilidade dos EUA auxiliarem o desenvolvimento dos países latino-americanos com um programa semelhante ao Plano Marshall aplicado na Europa, mas os governos Truman e Eisenhower resistiram por não considerarem a região prioritária para esse tipo de ação. De fato, entre 1948 e 1958, a América Latina recebeu apenas 2.4% da ajuda econômica americana no exterior. Entretanto, o crescimento do antiamericanismo, demonstrado na viagem de Nixon de 1958, e, sobretudo, o temor da influência da Revolução Cubana na região levaram os EUA a mudarem de posição na época em que Kennedy assumiu a presidência. Baseada em uma proposta de <strong>Juscelino Kubitschek</strong> (a <strong>Operação Pan-Americana</strong> de 1958), a Aliança Para o Progresso foi lançada oficialmente pelos EUA na Conferência Interamericana de Punta del Este, no Uruguai (agosto, 1961). O programa tinha o objetivo de desenvolver a democracia liberal e a modernização capitalista na América Latina para conter a penetração do comunismo. Originalmente, a Aliança Para o Progresso previa empréstimos facilitados, o planejamento econômico com objetivo de industrialização e investimentos sociais visando uma drástica redução da pobreza (alfabetização em massa, melhoria e ampliação da saúde pública, reforma agrária em áreas improdutivas) por um período de 10 anos. Entretanto, os seus resultados foram limitados. A América Latina recebeu mais de 22 bilhões de dólares em auxílio econômico durante uma década, a industrialização avançou e o crescimento das economias latino-americanas ultrapassou o nível dos anos 50 (mais de 3% em 1970, comparado aos 2.1% da década de 1950), mas isso foi insuficiente. Além de a região precisar de muito mais recursos, grande parte do dinheiro retornou para os EUA sob a forma de pagamento da dívida ou da remessa de lucro das empresas americanas multinacionais. Por outro lado, as elites econômicas resistiram em fazer as reformas sociais mais fundamentais, sobretudo a reforma agrária, e o analfabetismo diminuiu pouco. Além disso, em um contexto de radicalização política, crescimento dos movimentos populares reformistas e reação dos grupos conservadores, os regimes democráticos na região, tradicionalmente frágeis, não obtiveram o apoio que se esperava da cada vez mais numerosa classe média urbana e entraram em colapso, sendo substituídos por ditaduras militares. Apesar do desgosto de Kennedy com os golpes de Estado em 1962-1963 na Argentina, Peru, Guatemala, Equador, Republica Dominicana e Honduras, na prática ele pouco fez para efetivamente apoiar as democracias nesses países (com exceção do Peru, redemocratizado em 1963). A situação política se agravou e a Aliança Para o Progresso tomou um novo rumo depois que Kennedy foi assassinado (novembro 1963) e <strong>Lyndon B. Johnson</strong> assumiu a presidência dos EUA (1963-1969). Johnson manteve a ajuda econômica, mas questionou a viabilidade das reformas sociais na América Latina e a capacidade da região enfrentar a ameaça comunista por meios democráticos (ele estava especialmente preocupado que o Brasil, governado por João Goulart, virasse uma “nova China comunista”). O resultado foi o apoio do seu governo à instalação de ditaduras militares antipopulistas e anticomunistas, vistas como o melhor instrumento para a contenção dos movimentos revolucionários latino-americanos e para a criação da estabilidade política necessária ao desenvolvimento do capitalismo na América Latina, auxiliado e vinculado aos EUA. </div>
Cássio Marcelo de Melo Tuneshttp://www.blogger.com/profile/10357923622868867785noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8380482.post-19367144554610156922007-08-15T18:06:00.000-07:002007-08-16T16:46:54.840-07:003 Ano - O Brasil na Segunda Guerra<div align="justify"><strong>O Brasil e a Segunda Guerra Mundial<br /><br />a) Os EUA e a América Latina na década de 1930</strong><br /><br /><strong>O governo Franklin D. Roosevelt (1933-1945).</strong> FDR buscou consolidar a hegemonia dos EUA no Hemisfério Ocidental (as Américas) e afastar a crescente influência ideológica e econômica da Alemanha nazista na região. Visando criar uma imagem positiva dos EUA na América Latina para fortalecer sua liderança e ampliar os laços comerciais interamericanos, Roosevelt adotou a <strong>Política de Boa Vizinhança</strong>:<br />– Não-intervenção nos assuntos internos dos países latino-americanos, implicando em tolerar regimes autoritários e nacionalistas apesar de algumas divergências econômicas (criação de estatais e industrialização com substituição de importações)<br />– Fim das intervenções militares americanas na América Central e Caribe<br />– Assistência econômica e acordos comerciais com os países latino-americanos (exemplo: criação do <em>Export-Import Bank</em> em 1934 para financiar as compras latino-americanas de produtos dos EUA)<br /><br /><strong>As conferências interamericanas.</strong> Fundamental para a Política da Boa Vizinhança foram as conferências regionais pan-americanas organizadas periodicamente entre os EUA e os países da América Latina voltadas para a ampliação da solidariedade e cooperação hemisféricas. As conferências de Buenos Aires (1936) e de Lima (1938) estabeleceram o compromisso da segurança coletiva contra agressões que partissem de potências não-americanas e mecanismos de consulta mútua. De certa forma, isso transformou a Doutrina Monroe dos EUA em uma doutrina multilateral interamericana. Na I Reunião de Consulta, no Panamá (1939), foi declarada a neutralidade dos países americanos na guerra européia. A Reunião de Havana (1940) reforçou o compromisso de defesa mútua em face de uma ameaça externa.<br /><br /><strong>b) O Estado Novo entre a Alemanha e os EUA (1937-1940)<br /><br />O crescimento da influência alemã na Era Vargas.</strong> Ainda no início do governo constitucional de Vargas (1934-1937), portanto antes da instalação da ditadura do Estado Novo, o governo de Hitler lançou uma ofensiva diplomática e comercial no Brasil visando fortalecer os laços germano-brasileiros. Em 1934, foi assinado um acordo que expandiu o comércio bilateral entre a Alemanha e o Brasil. A instalação da ditadura estadonovista, com seus traços fascistas, parecia favorecer essa investida alemã. De fato, as importações brasileiras de produtos alemães em 1936-1938 superaram as americanas e transformaram a Alemanha na nossa principal parceira comercial. As relações germano-brasileiras, contudo, não ficaram livres de problemas e tensões, sobretudo por causa da repressão getulista às organizações nazistas que atuavam no sul do Brasil junto aos imigrantes alemães. Em fevereiro de 1938, o governo fechou o quartel-general nazista no RS e, em abril, proibiu organizações políticas estrangeiras em todo o país. Além disso, a repressão ao levante integralista em maio de 1938 parecia afastar ainda mais o Estado Novo do fascismo. As ações antinazistas e antifascistas de Vargas, porém, não abalaram o comércio Brasil-Alemanha e nem impediram a compra de armamento alemão para o reaparelhamento do exército brasileiro (acordo de março de 1938). No entanto, a eclosão da guerra na Europa, em setembro de 1939, seguida pelo bloqueio naval britânico à Alemanha, reduziu drasticamente o comércio alemão com o Brasil e estreitou, em contrapartida, os laços comerciais brasileiros com os EUA.<br /><br /><strong>As divisões internas no Estado Novo.</strong> O Brasil ficou oficialmente neutro na Segunda Guerra Mundial até o início de 1942. No entanto, os membros do Estado Novo ficaram divididos em dois grupos quanto ao possível alinhamento do Brasil no conflito internacional: os <strong>germanófilos</strong>, simpáticos à Alemanha (Filinto Muller, chefe da Polícia do DF; general Eurico Dutra, Ministro da Guerra; general Góis Monteiro, comandante do Estado-Maior do Exército; Francisco Campos, Ministro da Justiça) e os <strong>americanistas</strong>, favoráveis aos EUA (Oswaldo Aranha, ex-embaixador nos EUA e Ministro das Relações Exteriores).<br /><br /><strong>A posição de Vargas.</strong> Inicialmente, Vargas apresentou sinais contraditórios e ambíguos sobre sua posição na eventualidade do Brasil entrar na guerra (alinhamento com o Eixo ou com os EUA?). Ao mesmo tempo em que participava das conferências pan-americanas patrocinadas pelos EUA e estabelecia acordos comerciais com os americanos, buscou manter boas relações com a Alemanha e Itália. Na verdade, seu governo tentou extrair benefícios da disputa entre EUA e Alemanha pela influência no Brasil – uma posição que foi chamada de “eqüidistância pragmática”. De fato, para ele a questão central era obter financiamento externo para o programa brasileiro de industrialização, sobretudo para a criação da CSN (Companhia Siderúrgica Nacional) e a construção de uma usina siderúrgica em Volta Redonda, RJ. Em um primeiro momento, os EUA resistiram em financiá-la, levando Vargas a sinalizar sua simpatia pela causa do Eixo. Diante disso, os EUA mudaram sua posição e aceitaram apoiar o projeto industrial getulista, afastando o Brasil da Alemanha. Principais momentos:<br /><strong>– 1940, 11 junho.</strong> Discurso de Vargas no encouraçado Minas Gerais simpático ao Eixo: “Os países fortes têm direito de buscar um lugar ao sol”. Mussolini enviou uma mensagem à Vargas elogiando seu discurso.<br /><strong>– 1940, setembro.</strong> EUA decidem financiar a CSN em troca da exclusividade na importação de minerais estratégicos e borracha do Brasil.<br /><br /><strong>c) A construção da aliança Brasil-EUA (1940-1942)<br /><br />Os interesses do Brasil e dos EUA.</strong> Gradualmente, entre 1940 e 1942, os governos de Vargas e de Roosevelt construíram uma aliança estratégica que culminou na transformação do Brasil no principal parceiro político, militar e econômico dos EUA na América Latina e na entrada do Estado Novo na guerra contra a Alemanha. Na construção dessa aliança, os EUA queriam o fornecimento de minerais estratégicos brasileiros e a cessão de bases militares no nordeste do Brasil. Em contrapartida, o Brasil queria recursos para a modernização de suas forças armadas e para o programa de industrialização. Principais momentos da construção dessa aliança:<br /><strong>– 1940, outubro.</strong> Criação da <strong>Comissão Mista Brasil-EUA</strong>, voltada para o aprimoramento de medidas comuns de defesa.<br /><strong>– 1941, julho.</strong> O Brasil autoriza a instalação de bases militares americanas no nordeste.<br /><strong>– 1942, janeiro. Conferência do Rio de Janeiro</strong> (Reunião de Consulta dos Ministros de Relações Exteriores dos países americanos): assumindo o compromisso de solidariedade hemisférica com os EUA, que haviam entrado na Segunda Guerra Mundial em dezembro de 1941, o Brasil e a maioria dos países da América Latina rompem relações diplomáticas com o Eixo (Alemanha, Itália e Japão).<br />– A Alemanha reagiu afundando navios brasileiros (o primeiro foi o cargueiro Buarque): em 7 meses 19 navios foram afundados, matando 740 pessoas. No Brasil, aumentou a pressão interna pelo engajamento do país no conflito contra o Eixo.<br /><strong>– 1942, 4 julho.</strong> Passeata organizada pela <strong>UNE</strong> e apoiada por Oswaldo Aranha exige a entrada do Brasil na guerra. O germanófilo Filinto Muller, chefe da Polícia, que havia prometido proibir a manifestação, desistiu de reprimi-la e se demitiu.<br /><strong>– 1942, 15-17 agosto.</strong> Alemanha afunda 5 navios brasileiros<br /><strong>– 1942, 18 agosto.</strong> Grandes protestos nas capitais dos estados brasileiros exigem a declaração de guerra ao Eixo.<br /><strong>– 1942, 21 agosto.</strong> Vargas declara o estado de beligerância<br /><strong>– 1942, 25 agosto.</strong> O germanófilo general Góis Monteiro afasta-se do comando do Estado-Maior do Exército alegando motivo de saúde.<br /><strong>– 1942, 31 agosto.</strong> O Brasil declara guerra à Alemanha e Itália.<br /><br /><strong>d) O Brasil na guerra (1942-1945)</strong><br /><br />O Brasil foi o único país da América Latina que enviou tropas para a Europa na Segunda Guerra Mundial, onde participou diretamente dos combates contra a Alemanha (o México enviou um grupo aéreo que lutou contra os japoneses no Pacífico). A decisão de organizar uma força expedicionária do exército (<strong>FEB </strong>ou <strong>Força Expedicionária Brasileira</strong>), apoiada por unidades aéreas (<strong>FAB </strong>ou <strong>Força Aérea Brasileira</strong>) partiu da insistência de militares brasileiros e do governo Vargas, movidos pelo nacionalismo e pela busca de prestígio internacional. O Brasil lutou na Itália em 1944-1945, com suas forças subordinadas ao V Exército Americano (parte do XV Grupo de Exército), concentrando suas ações contra as defesas alemãs da Linha Gótica. A marinha brasileira também atuou na guerra em missões de patrulha e combate anti-submarino no Atlântico. Principais momentos:<br /><strong>– 1943, agosto.</strong> O Estado Novo decide enviar combatentes à guerra contra a Alemanha; o plano era criar um Corpo de Exército com 3 divisões, mas só a 1 Divisão de Infantaria Expedicionária (I DIE, depois chamada de FEB), com mais de 25 mil homens, foi organizada. A estrutura e os equipamentos eram americanos. O comando da FEB ficou com o general Mascarenhas de Morais.<br /><strong>– 1943, dezembro.</strong> Formação do primeiro agrupamento de caças da FAB.<br /><strong>– 1944, julho.</strong> Início do envio das tropas brasileiras à Itália, que são integradas ao V Exército Americano comandado pelo general Mark Clark.<br /><strong>– 1944, setembro.</strong> Primeiros combates da FEB na Itália<br /><strong>– 1945, fevereiro.</strong> A FEB toma Monte Castello, controlado pelos alemães, depois de mais de 3 meses de combate. Foi a ação militar mais famosa do Brasil na guerra.<br /><strong>– 1945, fevereiro-abril.</strong> A FEB avança no norte da Itália.<br /><strong>– 1945, abril.</strong> Mais de 16 mil soldados alemães, junto com unidades fascistas italianas, se rendem a FEB próximo de Fornovo.<br /><strong>– 1945, maio.</strong> A FEB alcança Turim, onde se encontra com tropas francesas aliadas, e persegue o exército alemão em fuga nos Alpes. Nesse momento, a guerra termina. </div>Cássio Marcelo de Melo Tuneshttp://www.blogger.com/profile/10357923622868867785noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-8380482.post-50862304970286538092007-08-05T18:42:00.000-07:002007-08-05T18:50:44.445-07:002 Ano- Crise do colonialismo português no Brasil<div align="justify"><strong>A crise do colonialismo português no Brasil (1760-1820)<br /><br />1. Antecedentes<br /><br />1.1 O Brasil em 1750: principal colônia de Portugal</strong><br /><br /><strong>Sociedade agrária e escravista</strong>. A população era de aproximadamente 1.500.000 (mais de 75% no meio rural ou em pequenos vilarejos), composta por 28% de brancos, 28% de mulatos e negros livres, 38% de escravos e 6% de índios sob autoridade portuguesa. Além dessa população colonial, possivelmente uns 250 mil índios continuavam livres da dominação de Portugal, vivendo nas partes inexploradas das regiões norte e centro-oeste.<br /><br /><strong>Declínio da mineração aurífera</strong>. Em 1700-1760, quando a mineração foi a principal atividade mercantil do Brasil, ela havia estimulado a interiorização da colônia (fundação de cidades em Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso), o crescimento populacional (maior imigração de portugueses e importação de escravos africanos), o desenvolvimento de diversas atividades econômicas voltadas para o mercado interno (agricultura, pecuária, artesanato) e a formação de novos grupos sociais dentro de uma sociedade escravista (camadas médias de pequenos comerciantes, profissionais liberais e artesãos). Com a decadência da mineração a economia colonial interiorana entrou em depressão, a sociedade aurífera empobreceu e a população de muitas das cidades das regiões mineradoras diminuiu.<br /><br /><strong>Início do “renascimento agrícola”:</strong> a agricultura de exportação voltou a ser a principal atividade geradora de riquezas para a metrópole (algodão, arroz, açúcar, cacau, anil, café), mas dinamizou mais a região costeira do que a interiorana.<br /><br /><strong>1.2 Portugal em 1750: potência decadente e fraca<br /><br />Antigo Regime.</strong> Com uma população de aproximadamente 2.250.000 habitantes, Portugal tinha uma sociedade agrária senhorial sob uma monarquia absolutista (dinastia Bragança) e uma política econômica mercantilista.<br /><br /><strong>Forte dependência externa, atraso econômico, parasitismo e pobreza.</strong> Portugal dependia em grande medida do Brasil (ouro, diamante e gêneros agrícolas tropicais por meio do monopólio comercial e da tributação colonial) e da Grã-Bretanha (proteção e importação de manufaturas). Na primeira metade do século XVIII, com a prosperidade da mineração colonial, o ouro e o diamante criaram uma expectativa ilusória de riqueza ilimitada, financiando o luxo da Corte e as importações de produtos britânicos. A pequena indústria manufatureira portuguesa sucumbiu diante da concorrência estrangeira, reforçada pelo <strong>Tratado de Methuen</strong> de 1703 com a Inglaterra (“o acordo dos panos e vinhos”), pelo qual Portugal eliminava as tarifas alfandegárias dos tecidos ingleses em troca da preferência inglesa ao vinho português. Com a decadência da mineração brasileira, a renda da metrópole diminuiu. Para agravar o quadro de crise, o contrabando na colônia desviava recursos de Portugal.<br /><br /><strong>2. A reação de Portugal<br /></strong><br />A monarquia portuguesa tentou superar os problemas do atraso e da dependência de Portugal e das limitações na exploração colonial com uma série de reformas modernizadoras. As reformas foram feitas nos reinados de <strong>D. José I</strong> (1750-1777) e da sua filha <strong>D. Maria I</strong> (1777-1816), inspiradas, em parte, no racionalismo iluminista – o “despotismo esclarecido”. As reformas tinham o objetivo de fortalecer o Estado português (aperfeiçoando a máquina administrativa e as forças armadas), a economia metropolitana (estimulando a produção interna para reduzir as importações inglesas) e o sistema colonial (dinamizando a economia agro-exportadora e aumentando a arrecadação tributária). Tudo isso implicou no fortalecimento da Coroa, em uma maior centralização política e no crescimento da interferência e do controle da vida colonial pela metrópole. O resultado foi o aumento da exploração mercantilista da colônia e, consequentemente, da insatisfação dos colonos com o domínio português.<br /><br /><strong>2.1 O reinado de D. José I (1750-1777)<br /></strong><br />O rei D. José I delegou a tarefa de definir e aplicar as reformas ao seu primeiro-ministro Sebastião José de Carvalho e Melo, o famoso <strong>Marquês de Pombal</strong>, um déspota esclarecido. As principais medidas das <strong>Reformas Pombalinas</strong> (1750-1777) foram a expulsão dos jesuítas; a criação de um sistema de ensino laico; o protecionismo alfandegário para estimular as indústrias portuguesas; a extinção das capitanias hereditárias e o fortalecimento do vice-rei; a criação de companhias de comércio no Brasil (do Grão-Pará e Maranhão; de Pernambuco e Paraíba); mudança da capital da colônia de Salvador para o Rio de Janeiro (1763); o estímulo a produção de algodão no Maranhão; a ampliação do tráfico de escravos negros (mas tentou proibir a escravidão indígena); combate mais rigoroso ao contrabando; e o aumento dos impostos.<br /><br /><strong>2.2 O reinado de D. Maria I (1777-1816)</strong><br /><br />Depois de assumir o trono, D. Maria I demitiu Pombal e adotou uma política conhecida como a “Viradeira”. Embora algumas das reformas pombalinas tenham sido anuladas (as companhias comerciais foram suprimidas), D. Maria I manteve a estratégia de aumentar o arrocho colonial sobre o Brasil. Sua medida mais famosa foi a <strong>Alvará de 1785</strong>, que proibiu fábricas no Brasil, com exceção da produção de tecidos grosseiros para os escravos.<br /><br /><strong>3. Tentativas de rebelião no Brasil<br /></strong><br />A insatisfação com o aumento do arrocho colonial e a influência das idéias iluministas, da Revolução Americana e da Revolução Francesa desencadearam os primeiros movimentos pela defesa da independência do Brasil. Esses primeiros movimentos não passaram de conspirações que foram descobertas a tempo pelas autoridades portuguesas e rapidamente sufocadas. Apesar do seu fracasso, demonstraram que pelo menos uma parcela da sociedade colonial havia optado pela ação armada para romper os laços políticos com Portugal.<br /><br /><strong>3.1 A Inconfidência Mineira (1789)</strong><br /><br />A Inconfidência (“deslealdade”) Mineira foi uma conspiração de membros da elite de Minas Gerais pela independência da colônia, o primeiro movimento desse tipo. Muitos mineiros ricos estavam arruinados por causa da crise econômica na região e do jugo colonial. Havia muito descontentamento com as proibições, monopólios e impostos, sobretudo com a perspectiva da cobrança da <strong>derrama</strong> (a taxa extra para alcançar a diferença que faltava no pagamento de 100 arrobas ou 1,5 toneladas de ouro que Minas deveria pagar anualmente). O autoritarismo e abusos do governador Cunha Menezes (1783-1788) agravou a situação. A chegada de um novo governador em 1788, o Visconde de Barbacena (Furtado de Mendonça), com a missão de aplicar a derrama aumentou ainda mais a tensão. Influenciados pelo iluminismo (as “idéias francesas”) e pela Revolução Americana, os inconfidentes propunham estabelecer uma república com a capital em São João Del Rei, fundar uma universidade em Vila Rica e estimular a criação de fábricas. A maioria defendia, porém a permanência da escravidão. Uma bandeira foi feita, com um triângulo representando a Santíssima Trindade e o lema Libertas quae sera tamen. A idéia era desencadear a rebelião quando a derrama fosse aplicada. Contudo, o plano foi mal preparado e descoberto com a traição de um dos conspiradores, Joaquim Silvério dos Reis, que delatou o movimento em março de 1789. Os inconfidentes foram presos (34 envolvidos) e uma devassa ordenada para apurar o crime. Depois de três anos de processo, o único executado (21 abril 1792) foi o alferes <strong>Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes</strong> – o único que assumiu toda a responsabilidade.<br /><br /><strong>3.2 A Conjuração Baiana (1798)<br /></strong><br />A Conjuração Baiana ou <strong>Revolta dos Alfaiates</strong> foi o segundo movimento de independência do Brasil. Ao contrário da Inconfidência Mineira, a Conjuração Baiana foi uma conspiração de base mais popular envolvendo as camadas mais baixas de Salvador, como mulatos livres, negros alforriados e escravos, entre eles alguns alfaiates e soldados. A Conjuração foi um reflexo da decadência econômica de Salvador e do seu declínio político (a capital fora transferida para o Rio de Janeiro durante as Reformas Pombalinas) em meio à insatisfação generalizada com os impostos e abusos. Os conjurados foram influenciados pelo jacobinismo da Revolução Francesa e pelas notícias dos eventos da Revolução Haitiana e, por isso, suas propostas foram muito mais radicais do que as da Inconfidência Mineira: incluíam uma república democrática, a abolição da escravidão e a igualdade de todos diante da lei. Cartazes foram colados nos muros de Salvador em agosto de 1798 divulgando essas idéias revolucionárias. A polícia prendeu alguns suspeitos e acabou descobrindo todo o movimento. No final, 34 pessoas foram condenadas (14 mulatos livres, 10 escravos e 10 brancos), das quais 4 (mulatos e negros) foram enforcadas: <strong>Luis Gonzaga das Virgens, Lucas Dantas, João de Deus Nascimento</strong> e<strong> Manuel Faustino dos Santos</strong>. </div>Cássio Marcelo de Melo Tuneshttp://www.blogger.com/profile/10357923622868867785noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8380482.post-56932216859353430122007-08-01T16:55:00.000-07:002007-08-03T03:11:56.174-07:003 série - A América Latina e a Guerra Fria (Parte I)<div align="justify"><strong>A América Latina na Era da Guerra Fria (1945-1991)<br /><br />1. O contexto internacional em 1945-1991</strong><br /><br /><strong>Ordem internacional bipolar.</strong> Fim da tradicional multipolaridade na ordem internacional e estabelecimento da bipolaridade, com dois centros principais de poder global – EUA e URSS. A nova ordem internacional foi conseqüência dos efeitos geopolíticos e econômicos da Segunda Guerra Mundial: o declínio do poder militar global da Europa Ocidental e do Japão e a transformação dos EUA e da URSS em “superpotências” com um poder muito acima dos demais países.<br /><br /><strong>Criação da Organização das Nações Unidas (ONU).</strong> Organismo internacional que substituiu a antiga Liga das Nações. Sediada em Nova York, a ONU foi criada pela Conferência de São Francisco (abril-junho 1945) com a finalidade de defender a paz mundial, os direitos humanos, a igualdade de direitos para todos os povos e a melhoria do nível de vida em todo o mundo. Os principais níveis de deliberação da ONU são a <strong>Assembléia Geral</strong> reunindo todos os países membros, com decisões tomadas por maioria de 2/3, e o <strong>Conselho de Segurança</strong> composto por 15 membros, sendo 5 permanentes (EUA, URSS/Rússia, GB, França e China), com poder de veto, e 10 rotativos.<br /><br /><strong>Expansão do socialismo no mundo.</strong> Isso ocorreu em dois sentidos. Primeiro, com a instalação de regimes socialistas na Europa Oriental, China, Coréia do Norte, Vietnã, Cuba e outras partes do Terceiro Mundo em decorrência da expansão militar soviética no final da Segunda Guerra Mundial (ocupação militar do leste europeu e imposição de governos comunistas na região) e de revoluções comunistas em áreas coloniais ou neocoloniais. Segundo, com o crescimento dos partidos comunistas e da influência das idéias marxistas nos países capitalistas, principalmente nos sindicatos e outras organizações de trabalhadores, entre os intelectuais e no movimento estudantil.<br /><br /><strong>Divisão do mundo em dois grandes blocos com sistemas econômico-sociais distintos.</strong> O bloco <strong>capitalista</strong> (economia de mercado, propriedade privada, individualismo, predomínio da livre iniciativa) sob hegemonia dos EUA e o bloco<strong> socialista</strong> (economia estatizada e planificada, ausência de propriedade privada, coletivismo) sob hegemonia da URSS. Essas hegemonias não ficaram livres de contestação. No bloco capitalista, por exemplo, a França (presidente Charles de Gaulle) passou a questionar a liderança americana e defendeu a união da Europa e sua transformação em uma Terceira Força entre as aspirações hegemônicas das duas superpotências. No bloco socialista, a Iugoslávia (Tito) e, sobretudo, a China (Maozedong) também desafiaram a supremacia soviética.<br /><br /><strong>A Guerra Fria.</strong> Foi o confronto político-estratégico e ideológico entre os EUA e a URSS pela supremacia mundial. A disputa caracterizou-se pela ausência de uma guerra direta entre as duas superpotências em razão do equilíbrio do poder nuclear e do temor da destruição mútua (“Terror nuclear”). Mas ambas entraram em confrontos indiretos por meio do envolvimento nos conflitos locais, intervenções militares nas respectivas áreas de influência e apoio militar aos países aliados em guerras regionais.<br /><br /><strong>Descolonização da Ásia e da África.</strong> A independência das ex-colônias européias e japonesas, resultando na formação do Terceiro Mundo, que passou a incluir também a América Latina. Em alguns casos a independência se deu por meio de violentas guerras de libertação nacional como, por exemplo, contra a França na Indochina e na Argélia, e contra Portugal em Angola e Moçambique. Em geral, essas guerras ou revoluções nacionalistas eram lideradas por comunistas ou contaram com o seu apoio e o da URSS, o que transformou o Terceiro Mundo em um dos principais palcos da Guerra Fria. A soberania política dos novos países, entretanto, não eliminou a dependência econômica “neocolonial” (colonialismo econômico). Consequentemente, a luta pela superação do atraso, do subdesenvolvimento e da pobreza virou o maior desafio para os países do Terceiro Mundo. Nesse processo, eles buscaram o auxílio internacional da ONU, das superpotências e das ex-metrópoles, assim como a cooperação no próprio bloco terceiro-mundista. Foi nesse contexto que se deu a <strong>Conferência Afro-Asiática de Bandung</strong>, na Indonésia (abril 1955), uma reunião dos Estados asiáticos e africanos organizada pelo Egito, Indonésia, Índia, Paquistão, Birmânia e Sri Lanka que visou promover a cooperação econômica e cultural dos países do Terceiro Mundo e combater o colonialismo. A Conferência e o idealismo terceiro-mundista originaram o <strong>Movimento dos Países Não-Alinhados</strong> ou <strong>MNA</strong> (setembro 1961), uma organização internacional reunindo mais de cem países da Ásia, África, América Latina e Europa Oriental que não se consideraram alinhados com nenhuma das superpotências e afirmaram sua neutralidade na Guerra Fria (o que não aconteceu de fato). Os idealizadores do MNA foram os dirigentes nacionalistas ou socialistas da Índia (Nehru), Iugoslávia (Tito), Egito (Nasser), Indonésia (Sukarno) e Gana (Nkrumah). O MNA, que existe até hoje, busca garantir a soberania dos seus membros contra qualquer modalidade de dominação colonial ou de neocolonialismo. O Brasil não é membro formal do MNA, mas costuma enviar observadores para suas reuniões.<br /><br /><strong>2. O contexto latino-americano em 1945-1991</strong><br /><br /><strong>Avanço da modernização capitalista.</strong> Na segunda metade do século XX, a América Latina passou por um processo mais acelerado de urbanização e de industrialização. No final do período, países como Brasil, México, Argentina e Chile tornaram-se de certa forma “modernos” (urbanos e industriais) apesar da persistência de bolsões de pobreza e de subdesenvolvimento econômico. A modernização modificou a composição tradicional da estrutura social. A classe média e o operariado cresceram proporcional e quantitativamente e a elite de industriais, comerciantes, banqueiros e prestadores de serviços superou em alguns países as elites fundiárias em termos de poder econômico e influência política.<br /><br /><strong>Limites da modernização latino-americana.</strong> Apesar do avanço da modernização, nenhum país da América Latina conseguiu se tornar desenvolvido na segunda metade do século XX. Antigos e novos problemas impediram a plena modernização da região, entre eles: persistência de uma grande concentração de renda, desigualdade social e pobreza (sobretudo no meio rural e nas periferias das cidades); mercado interno limitado pelo baixo poder aquisitivo de uma expressiva parcela da população; ensino público deficiente; alto índice de corrupção, de criminalidade e de impunidade; sistema tributário distorcido; precariedade dos serviços públicos; forte dependência da exportação de matérias-primas e da importação de capital e tecnologia; instabilidade política e fragilidade dos regimes democráticos (partidos políticos e instituições fracas e pouco representativas; constantes intervenções militares na política por meio de golpes de Estado). O resultado de tudo isso foi uma grande pressão por justiça social, distribuição de renda, igualdade e reformas radicais (como a reforma agrária), partindo principalmente de intelectuais, sindicatos, setores progressistas da Igreja e organizações estudantis de tendências populistas e esquerdistas que, em um quadro de crescente influência do marxismo, buscavam mobilizar os trabalhadores em “movimentos sociais” contra a ordem vigente. Para esses grupos políticos a única maneira de transformar a sociedade em benefício dos pobres era democratizar o Estado (que para os mais extremistas pressupunha a instalação de uma ditadura revolucionária), aumentar sua capacidade de interferir na economia em moldes coletivistas (parcial ou totalmente socialista) e combater o capital estrangeiro, sobretudo o americano (antiamericanismo, antiimperialismo).<br /><br /><strong>Democracias frágeis, instabilidade política e governos militares.</strong> Os sistemas políticos da América Latina não ficaram imunes às mudanças causadas pela intensificação da urbanização e da industrialização em um quadro ainda muito marcado pela pobreza e exclusão social. Nos países onde a modernização foi mais intensa, a estrutura republicana oligárquica tinha entrado em crise nas décadas de 1920 e 1930 sendo superada, primeiro, por regimes autoritários nacionalistas que tentaram conciliar os diferentes interesses dos setores agrários e industriais. Depois da Segunda Guerra Mundial, o autoritarismo foi substituído por democracias que continuaram buscando a composição entre os interesses das elites, as expectativas das classes médias e as reivindicações das massas trabalhadoras em um contexto de liberdade política. De uma maneira geral, essa conciliação democrática não foi possível, sobretudo em situações de intensa inflação, quando ocorria uma queda no poder aquisitivo. O <strong>populismo</strong>, cujo apogeu foi em 1945-1965, tentou fazer isso mobilizando os trabalhadores e os sindicatos com o nacionalismo econômico e o trabalhismo, mas fracassou diante do crescimento de um movimento operário cada vez mais exigente e difícil de ser controlado, e da resistência das camadas dominantes, aliadas ao capital estrangeiro, a mudanças mais profundas no capitalismo latino-americano. Com efeito, em um ambiente de intensa rivalidade ideológica que refletia a Guerra Fria, o operariado tendia a se aproximar dos trabalhadores rurais em movimentos de massas que reivindicavam reformas sociais e econômicas, chocando-se com os interesses dos grupos empresariais e das oligarquias agrárias. As elites urbanas e rurais tendiam, assim, a conciliar seus interesses (política industrial, defesa do capital contra os sindicatos e modernização da infra-estrutura com preservação da estrutura agrária e o incentivo à exportação de gêneros agrícolas) diante das pressões populares por mudanças mais radicais (ampliação dos direitos sociais, fortalecimento dos sindicatos, reforma agrária), o que explica em grande medida o conservadorismo dessas elites e os limites que impunham aos rumos das democracias latino-americanas. Assim, a ascensão desses movimentos de massas populistas ou de tendência socialista (os comunistas de fato estavam infiltrados ou apoiaram esses movimentos, em geral sob orientação da URSS), e a resistência das elites econômicas às reformas sociais criaram uma forte instabilidade política nas democracias da América Latina pós-1945 e resultaram em freqüentes golpes de Estado contra governos considerados radicais ou por demais fracos para conter o radicalismo popular. A derrubada desses governos, entretanto, não assegurava o retorno da normalidade constitucional devido à incapacidade das elites econômicas de conter as pressões dos trabalhadores em um quadro de liberdade democrática. O resultado, frequentemente, eram impasses políticos que só puderam ser solucionados com a instalação de governos militares antipopulistas e anticomunistas de “segurança nacional” nas décadas de 1960 e 1970, capazes de reprimir os movimentos de massas, eliminar a “subversão comunista” e manter a ordem social sem, contudo, abandonar as políticas de modernização econômica. Esses regimes militares contaram também com o importante apoio do capital estrangeiro, interessado na estabilidade política e na proteção dos seus negócios, e do governo dos EUA, empenhado em uma “cruzada anticomunista” e na afirmação de sua hegemonia sobre a América Latina.<br /><br /><strong>O debate do caminho da modernização capitalista.</strong> Os intelectuais, as elites econômicas e a classe política ficaram divididas quanto ao melhor caminho da modernização capitalista da América Latina e da superação do subdesenvolvimento. De uma maneira geral, foram formuladas duas propostas bem diferentes. A primeira foi a do <strong>liberalismo tradicional</strong>, que pregava a modernização evolutiva e natural via a livre-iniciativa, redução dos gastos públicos e dos impostos, abertura para o capital estrangeiro e especialização na produção de matérias-primas para o mercado externo. Essa visão perdeu influência no período e passou a ser defendida por uma minoria de intelectuais que passaram a ser chamados de “neoliberais”. A segunda foi a do <strong>nacional-desenvolvimentismo</strong>, favorável ao intervencionismo governamental no capitalismo visando o desenvolvimento da infra-estrutura, a industrialização com substituição de importações (enfatizando o mercado interno) e a estatização dos setores estratégicos da economia (energia, comunicações, transporte). Essa visão predominou no período e foi adotada, em escala variada e sob diversas modalidades, por regimes populistas, não-populistas, democratas e autoritários. O nacional-desenvolvimentismo resultou, ao longo do período, no crescimento do aparelho de Estado, da regulamentação econômica, do protecionismo, do funcionalismo, da burocracia, dos gastos públicos e da carga tributária. A insuficiência de recursos nacionais, em grande parte por causa das limitações e distorções do sistema fiscal, forçou o Estado a buscar financiamento por meio de empréstimos, principalmente no exterior. A conseqüência foi o crescimento da dívida pública em um quadro de forte desequilíbrio das contas governamentais e de inflação elevada. Com o nacional-desenvolvimentismo, o capital estrangeiro sofreu restrições em alguns setores, mas ampliou sua atuação em outros (empréstimos, investimentos diretos de multinacionais). Na verdade, a política nacional-desenvolvimentista implicou na formação de três setores econômicos (o “tripé econômico”): o estatal, o privado nacional e o multinacional. Cada um desses setores foi enfatizado de forma diferente dependendo do país, da época e do governante.<br /><br /><strong>3. Os EUA e a América Latina em 1945-1991<br /><br /></strong><em>A Guerra Fria alterou a lógica das relações interamericanas, elevando a proteção da “segurança nacional” ao topo da agenda da política externa dos EUA e transformando a América Latina (e outras áreas do Terceiro Mundo) simultaneamente no campo de batalha e no prêmio do conflito entre capitalismo e comunismo, Ocidente e Leste, EUA e URSS. Em resposta aos desafios soviéticos, os Estados Unidos buscaram estender e consolidar sua supremacia no Hemisfério Ocidental. Lançando uma cruzada anticomunista, os Estados Unidos institucionalizaram as alianças políticas e militares com as nações da região; ofereceram colaborar com os regimes autoritários contanto que fossem anticomunistas; encorajaram (ou compeliram) governos amigos a esmagar os movimentos esquerdistas de trabalhadores e declarar ilegal os partidos comunistas; e orquestraram a derrubada militar de governos eleitos sob o argumento de que eram “brandos” com o comunismo. O temor de uma “ameaça soviética” nas Américas foi grandemente exagerado, mas ainda assim ele teve implicações cruciais para a política dos EUA. Por volta de meados da década de 1950, Washington lançara as linhas políticas que continuariam pelos anos de 1980.<br /></em><br /><strong>Peter Smith.</strong> <strong><span style="color:#ff0000;">Talons of the Eagle: Dynamics of U.S.-Latin American Relations</span></strong> (1996, Nova York, Oxford)<br /><br /><strong>3.1 O governo Harry S. Truman (1945-1953)<br /><br />Aspectos gerais</strong>. Harry S. Truman (1884-1972), do Partido Democrata, era vice-presidente dos EUA quando, em abril de 1945, assumiu o governo americano com a morte de Franklin Roosevelt. Foi na presidência Truman que ocorreu o final da Segunda Guerra Mundial (foi dele a decisão de bombardear o Japão com armas nucleares), a fundação da ONU, a imposição do comunismo na Europa Oriental pela URSS, o início da Guerra Fria, a divisão da Alemanha em um Estado capitalista e outro socialista, o Plano Marshall de reconstrução da Europa Ocidental, a crise do bloqueio de Berlim pelos soviéticos, a criação da OTAN e da CIA, a vitória da Revolução Comunista Chinesa e a Guerra da Coréia. Truman reagiu contra a expansão soviética e socialista com a política de contenção do comunismo (Doutrina Truman), aplicada principalmente na Europa e Ásia. No próprio EUA o senador republicano Joseph McCarthy desencadeou em 1950-1954 uma campanha de perseguição a comunistas ou supostos comunistas no governo americano e em outros setores do país (o <strong>macarthismo</strong>). Na América Latina, Truman buscou assegurar a hegemonia americana e combater a expansão comunista por meio do ideal da solidariedade hemisférica e segurança coletiva, em uma estrutura internacional separada da ONU.<br /><br /><strong>Apoio americano a redemocratização dos regimes autoritários nacionalistas da América Latina (1945-1946). </strong>No contexto do imediato pós-Segunda Guerra Mundial, marcado pela derrota do nazi-fascismo, pela expectativa de expansão do liberalismo e pela necessidade de aumentar as exportações americanas, o governo Truman apoiou, em um primeiro momento, a onda de democratização da América Latina. Os regimes, movimentos e líderes autoritários nacionalistas ou populistas latino-americanos passaram a ser vistos como “semifascistas”, com políticas econômicas protecionistas e estatizantes que restringiam a expansão do comércio e os investimentos americanos na região. No Brasil, por exemplo, os EUA afastaram-se de Vargas (um aliado americano na guerra) e ficaram contra a ditadura do Estado Novo. Do mesmo modo na Argentina, os americanos fizeram oposição à candidatura presidencial do coronel Perón, membro do governo militar. Simultaneamente, a aliança antifascista EUA-URSS, vitoriosa na guerra, foi rompida em razão das divergências político-ideológicas e das desconfianças mútuas dos americanos e soviéticos, sobretudo na questão sobre a nova ordem internacional européia no pós-guerra. Foi nessa conjuntura que a Guerra Fria começou a ganhar corpo. Por sua vez, no processo de democratização latino-americana, o clima de liberdade política e de expressão favoreceu o crescimento do movimento comunista e das correntes “progressistas” (o próprio populismo, grupos socialistas) que mobilizavam as massas em prol de reformas sociais, assustando as elites tradicionais, os militares e os EUA.<br /><br /><strong>O início da política americana de contenção do comunismo (1946-1948).</strong> Com a eclosão da Guerra Fria, o governo Trumam começou a considerar o combate ao comunismo na América Latina mais prioritário do que a democratização da região e buscou estabelecer uma organização de segurança regional, além de pregar a restrição das atividades dos partidos comunistas latino-americanos. Com efeito, em 1947-1948 os partidos comunistas foram proibidos em vários países da América Latina (no Brasil em maio de 1947). Entre os principais momentos da escalada da contenção do comunismo e da afirmação da liderança dos EUA na América Latina podemos destacar:<br /><br />■ <strong>1947, março – Doutrina Truman:</strong> em um discurso no Congresso americano, Truman afirmou que os EUA ajudariam qualquer país ameaçado pelo comunismo.<br /><br />■<strong>1947, julho – Lei de Segurança Nacional dos EUA:</strong> reorganizou as Forças Armadas, a política externa e a comunidade de informação americanas. A LSN criou a famosa <strong>CIA</strong> (Central Intelligence Agency ou Agência Central de Inteligência), encarregada de obter dados sobre governos, organizações e pessoas estrangeiras, propagar informações e contra-informações favoráveis aos EUA e organizar operações secretas no exterior. A CIA foi um dos principais instrumentos da estratégia americana de combater a expansão do comunismo no mundo.<br /><br />■<strong>1947, setembro – Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR)</strong> ou <strong>Pacto do Rio:</strong> Assinado no Rio de Janeiro, foi o tratado de defesa mútua entre os EUA e os países da América Latina, baseado no princípio de que um ataque contra um dos seus signatários seria considerado um ataque contra todos. O TIAR foi beneficiado pela aprovação dos artigos 51-53 da Carta da ONU, que permitia que organizações defensivas regionais agissem independentemente das Nações Unidas em situações de emergência.<br /><br /><strong>■1948, abril – Organização dos Estados Americanos (OEA):</strong> criada na Nona Conferência Internacional dos Estados Americanos, em Bogotá, Colômbia. Com sede em Washington, nos EUA, a OEA tem o objetivo de promover a solidariedade, cooperação, soberania, paz e a segurança dos países americanos. Com o TIAR e a OEA, os EUA buscaram assegurar a sua hegemonia na América Latina baseada em uma estrutura regional de consulta e segurança coletivas, independente da ONU. O princípio de intervenção militar para garantir a paz e a segurança no Hemisfério Ocidental foi mantido, mas deixou de ser considerado, teoricamente, um direito unilateral dos EUA e passou a ser visto como uma ação multilateral dos países americanos sob a liderança de Washington.<br /><br /><strong>Retorno do autoritarismo (1948-1953).</strong> Diante da ascensão dos movimentos de massas, as elites dominantes em vários países da América Latina apoiaram a derrubada dos governos democráticos e a instalação de ditaduras para “restaurar a ordem”. O governo Truman reconheceu prontamente os novos regimes autoritários anticomunistas. Em 1954, a democracia só sobrevivia, ainda assim em caráter precário, no Brasil, Chile, Uruguai e Costa Rica. Paralelamente, os EUA ampliavam seus laços de cooperação com os militares latino-americanos, sobretudo por meio de treinamentos em instalações americanas, como a famosa Escola de Instrução do Fort Gulick, no Panamá (renomeada em 1963 “Escola das Américas”). </div>Cássio Marcelo de Melo Tuneshttp://www.blogger.com/profile/10357923622868867785noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-8380482.post-11371888419694870162007-06-22T15:31:00.000-07:002007-06-22T15:42:18.296-07:003 Série - Nazismo e ComunismoInteressante o texto "A destruição da política pelo nazismo e comunismo" que <strong>Carlos I. S. Azambuja</strong> colocou no Mídia Sem Máscara (22 de junho), extraído do livro <strong><span style="color:#ff0000;">A Infelicidade do Século</span> </strong>de <strong>Alain Besançon</strong> (Editora Bertrand Brasil, 2000). Leiam:<br /><br /><strong>A destruição da política pelo nazismo e comunismo</strong><br /><br />Antes de tomar o Poder e, para tomá-lo, os partidos comunistas e os nazistas utilizam todos os meios da política. Eles se instalam no jogo político, apesar de eles mesmos, segundo seus próprios critérios e sua disciplina interna, se colocarem fora do jogo. Por exemplo, quando o Partido Bolchevique reivindicou a terra para os camponeses e a paz imediata, não era para se contentar com o êxito dessas duas reivindicações. Tratava-se de colocar os camponeses e os soldados do seu lado a fim de lançar o processo revolucionário. Feita a revolução, a terra foi expropriada e a guerra foi ativamente preparada sem que o partido tivesse visto nisso qualquer contradição.<br />Uma vez no Poder, a política do partido fica mais do que nunca voltada para a destruição do político. As formas orgânicas da vida social, a família, as classes, os grupos de interesse, os corpos constituídos, são suprimidos. A partir daí, as pessoas, privadas de todo direito de associação, de agregação espontânea, de representação, reduzidas à condição de átomos, são colocadas em um novo enquadramento, o qual se modela sobre aquele que deveria subsistir se o socialismo existisse como sociedade. Ele assume, então, a denominação de sovietes, de uniões, de comunas.<br />O Partido Nazista imitou sumariamente a destruição comunista do político. Ele também tomou o Poder escondendo seus objetivos reais, enganando seus aliados provisórios para, em seguida, liquidá-los. Ele também criou quadros novos e integrou neles a juventude e as ‘massas’. Destruir imediatamente os velhos quadros não era seu objetivo. Contentou-se em neutralizá-los e submetê-los. Assim, sobreviveram no nazismo os empresários, um mercado, juízes e antigos funcionários. A seguir veio a guerra, que acentuou e acelerou o controle nazista. Não se sabe o que teria acontecido se ela tivesse sido ganha.<br />O <em>Führerprinzip</em> foi uma peça essencial da trama social. Ela se organizava em torno de uma hierarquia de chefes leais, devotados ao Reich, ligados por um juramento, e isso até o fundo da escala a partir do chefe supremo, cuja exaltação era coerente com o espírito do sistema. O Partido Comunista também era hierarquizado. A originalidade do partido de Lenin residiu no fato de que, desde a sua fundação, o centro designava à ‘base’ aqueles que deveriam ser eleitos, de tal modo que a eleição democrática se tornava simplesmente um teste do poder absoluto do ‘centro’. É que a consciência gnóstica, o saber científico fundador do partido, se encontrava teoricamente no organismo dirigente e se difundia a partir desse ponto para a ‘base’ que, remetendo o poder para o ‘centro’, manifestava seu progresso na assimilação da doutrina e da ‘linha’. Dessa forma, viu-se aumentar o culto ao chefe Lenin, o que chegou ao seu apogeu com Stalin. Trotsky, Zinoviev, Bukharin, Stalin buscavam o mesmo objetivo: o socialismo, mas seria necessário que um deles fosse o chefe. Sucederam-se, então, em circuito fechado as traições, prisões e assassinatos. O culto subsistiu mas, no tempo de Brejnev já demonstrava as suas fraquezas.<br />Os dois regimes – o nazista e o comunista – se referem a um passado mítico sobre o qual se modela um futuro imaginário (...) A idéia de Marx, segundo as palavras de Raymond Aron, era ir de Rousseau a Rousseau, passando por Saint-Simon, isto é, pelo progresso técnico e industrial. Já o hitlerismo era voluntarista: apenas a obra demiúrgica da vontade poderia restaurar a boa selva, em equilíbrio biológico. O leninismo contava com o automovimento da História para dar à luz a Arcádia moderna. O automovimento produz o partido, instrumento desse parto. O voluntarismo também é exaltado mas, ao mesmo tempo, ele é exaltado e negado, uma vez que ele – o partido – encarna apenas a consciência da necessidade.<br />Entre esse passado fabuloso e esse futuro ideal, o tempo presente não tem valor próprio (...) O passado próximo é o inimigo, o presente não conta, tudo fica submetido ao futuro, aos fins últimos, à utopia.<br /><br /><strong>Os fins ilimitados do nazismo –</strong> A política de apaziguamento conduzida por Chamberlain, e em certa medida a política de divisão seguida por Stalin em 1940, repousavam sobre a hipótese de que Hitler poderia estar satisfeito com o que já havia obtido, pois já havia rasgado o Tratado de Versalhes e ‘adquirido’ bastantes ‘terras a Leste’ (...) Tendo reorganizado a Alemanha, eliminado os inaptos, os judeus, os ‘inferiores’, ele sentiu necessidade de ir mais longe (...) Fez um pacto com a União Soviética e, em uma leviandade incompreensível, declarou guerra aos EUA.<br />Nessa guerra, o nazismo revelou a si mesmo a sua vocação para exterminar fatia por fatia toda a Humanidade. Na medida em que o mundo resistia, a polaridade ariano-judia se tornava cada vez mais evidente. O judeu aparecia aos olhos de Hitler como o indício de resistência à realização do grande plano, pois tinha corrompido o mundo inteiro, conspurcado tudo, ‘enjudeusado’ tudo. Por isso, era a totalidade da humanidade que deveria ser purificada. Exterminada, portanto.<br />As ordens de aniquilamento dadas por Hitler, em 18 e 19 de março de 1945, não visavam uma luta final heróica (...) Para uma luta desse tipo, pouco adiantava colocar centenas de milhares de alemães no caminho da morte, nem fazer destruir tudo o que poderia servir à mais humilde das sobrevivências. Esse último genocídio de Hitler, agora voltado contra a própria Alemanha, tinha como único objetivo punir os alemães por sua recusa em agir como voluntários na direção de uma luta final heróica, no desempenho do papel que Hitler lhes tinha atribuído. Aos olhos de Hitler, isso constituía um crime passível de pena de morte. Um povo que não assume o papel que lhe era destinado deve morrer (1).<br />Hitler se recusou a construir ‘o nazismo em um só país’ e, para isso, os nazistas praticaram a ‘tática do salame’, dado que cada ‘raça’, antes poupada, via em seguida chegar a sua vez. Todavia, rapidamente tudo isso desembocou em um massacre geral. Eles não poderiam, como teria feito Stalin, prometer a independência à Ucrânia, dispostos a acertar suas contas com ela após a vitória. Foi necessário que eles tratassem de exterminá-la imediatamente, o que levou os ucranianos a ficarem contra eles, nazistas.<br />Hitler acreditava ser o veículo genial da <em>Volksgeit</em> e que suas ordens, no início prudentes, depois insanas, vinham de algo situado acima dele, e essa embriaguez era em parte comunicada ao seu povo. Por isso a irracionalidade na condução da guerra. Algumas decisões desejadas por seus generais teriam podido equilibrá-la e, pelo menos, levá-la a um empate, sob a condição, nunca dada, de que ela se propusesse fins limitados, falta que acabou, por culpa de Hitler e de seu wagnerismo doentio, levando-o à derrota.<br /><br /><strong>Os fins ilimitados do comunismo –</strong> O projeto comunista é declaradamente total. Ele busca em extensão a revolução mundial, compreendendo por isso uma mutação radical da sociedade, da cultura e do próprio ser humano, autorizando a colocação em prática de meios racionais para obter esses fins alheios à razão. Lenin, durante a guerra, mostrou-se um sonhador quimérico, sobrepondo às realidades do mundo as entidades abstratas do capitalismo, do imperialismo, do oportunismo, do esquerdismo e de muitos outros ‘ismos’ que, em sua opinião, explicavam tudo. Ele os aplicava tanto à Suiça, como à Alemanha e à Rússia (...) A tomada do Poder por um partido comunista é preparada por uma luta puramente política no seio de uma sociedade normalmente política. É lá que ele treina suas táticas e as coloca em prática depois da vitória do partido. Aquela – por exemplo – chamada ‘tática do salame’, que consiste em fazer alianças com forças não-comunistas, de forma que force o aliado a participar da eliminação dos adversários: primeiro, a ‘extrema direita’, com a ajuda de toda a esquerda; depois, a fração moderada dessa esquerda e, assim, sucessivamente, até a última ‘fatia’, que deve submeter-se e ‘fundir-se’ sob pena de ser, por sua vez, eliminada. Esse profissionalismo, que inclui a astúcia, a paciência, a racionalidade, quanto ao objetivo buscado, faz a superioridade do leninismo. Mas trata-se apenas de destruição, pois a construção é impossível porque esse objetivo é insensato. A prática comunista não segue uma inspiração estética, mas procede, a cada instante de uma deliberação ‘científica’. A falsa ciência copiando da verdadeira seu caráter demonstrativo e seus procedimentos lógicos. Isso apenas torna mais louca a empresa, mais implacável a decisão e mais difícil a correção, pois a falsa ciência impede que se constatem os resultados da experiência. Pouco a pouco a destruição se amplia e se torna total. Na Rússia ela percorreu seis etapas: primeiro, a destruição do adversário político: a antiga administração. Isso foi feito em um piscar de olhos, logo em seguida ao putsch de outubro de 1917. Depois, a destruição das resistências sociais, reais ou potenciais: partidos, exército, sindicatos, cooperativas, corpos culturais, universidades, escolas, academias, Igreja, editoras, imprensa. No entanto, o partido logo se dá conta de que o socialismo nem sempre existiu como sociedade livre, auto-regulada e que, assim, a coação é, mais do que nunca, necessária para fazê-lo surgir. Mas a doutrina prevê que há apenas duas realidades – o socialismo e o capitalismo. É nesse momento, então, que a realidade se confunde com o capitalismo e que é preciso – terceira etapa – destruir toda a realidade: a aldeia, a família, os restos da educação burguesa, a língua russa. É preciso estender o controle sobre cada indivíduo tornado solitário e desarmado pela destruição de seu sistema de vida, levá-lo para um novo sistema em que será reeducado, recondicionado. Eliminar, enfim, os inimigos escondidos.<br />O fracasso da construção do socialismo no exterior deveu-se ao ambiente externo hostil. Pela sua simples existência, ele é uma ameaça, quaisquer que sejam as cores desse espectro hostil: democracia burguesa, social-democracia, fascismo. É preciso então – quarta etapa – criar em cada país organizações de tipo bolchevique com um organismo central para coordená-los e adaptá-los a esse modelo central, o Komintern. Quando, valendo-se das circunstâncias, o comunismo pôde se estender, as novas zonas agregadas ao ‘campo socialista’ conheceram etapas análogas de destruição. Porém, em toda a extensão do campo, o partido (pela voz de Stalin) assinala que ‘o capitalismo está mais forte que nunca’, se infiltra e se estende no próprio partido, que perde a sua virtude. Cabe então ao líder do partidário, e apenas a ele, destruir o partido (quinta etapa), para recriar um outro com seus restos. Stalin fez isso uma vez, não sem imitar Hitler e a sua ‘noite dos longos punhais’. Ele se preparava para fazê-lo uma segunda vez quando a morte o surpreendeu. Mao-Tsetung fez duas vezes: no momento do ‘Grande Salto para Frente’ e, depois, mais nitidamente ainda, na ‘Revolução Cultural’.<br /><br /><strong>Usura e Destruição –</strong> Na lógica pura dos dois sistemas levada ao limite está contido o extermínio de toda a população da Terra. Mas essa lógica não se aplica e não pode se aplicar até o fim. O princípio do comunismo é o de subordinar tudo à tomada e conservação do Poder, pois é ao Poder que cabe a responsabilidade de realizar o projeto. Todavia, as destruições causam um tal desgaste que o poder do partido corre o risco, não de enfrentar uma revolta geral porque sabe preveni-la, mas de ver desaparecer a matéria humana sobre a qual ele se exerce. Foi o que aconteceu no final do ‘comunismo de guerra’: a Rússia se afundava, se liquefazia quando Lenin decretou a trégua da NEP (...) Enquanto a revolução não vence em escala mundial, o mundo exterior, mesmo reduzido a uma ilhota minúscula, é uma ameaça mortal. Por sua simples existência, ele corre o risco de fazer explodir a bolha de sabão da ficção socialista. E pouco importa que ele seja verdadeiramente hostil, como ele só foi uma vez com Hitler, ou que ele queira apenas a tranqüilidade e o status quo, como desejou o Ocidente depois da derrota do nazismo. Para manter o mundo real à distância, para eventualmente destruí-lo, é preciso uma força real à disposição do partido e esta só pode ser tirada da realidade que ele controla. Ele tem necessidade de um mínimo de economia real para nutrir a população de um mínimo de tecnologia e de indústria para equipar o Exército. Subsistem então produtores, técnicos, cientistas. O partido não pode fazer passar para o outro lado do espelho tudo o que ele é, pois seria vítima do nada que ele mesmo produziu. Enfim, a penúltima etapa, a destruição do próprio partido, colide com os reflexos vitais de sobrevivência. Depois dos grandes expurgos de Stalin e de Mao, o partido optou por algumas medidas ‘conservadoras’: não se matam mais comunistas, eles apenas caem em desgraça. Na Rússia, tudo isso levou à decadência do sistema. O partido envelheceu, porque a conservação do Poder terminou por se identificar com a conservação dos postos e dos cargos.<br />As táticas colocadas em prática em tempos dramáticos só servem para isso. Brejnev apodreceu lentamente na direção máxima e o partido se corrompeu, pois embora se dedicando mais aos objetivos do comunismo, quis, ao mesmo tempo, usufruir o poder e desfrutar das riquezas. Sai da irrealidade e entra na realidade devastada por sua ação, onde só encontra, em abundância, mercadorias vulgares, que nem a arte consegue embelezar, como a vodca, as datchas e as grandes limusines. Quanto ao povo, este se atola na porção da realidade que lhe foi sempre concedida, se vira como pode, se desinteressa de um regime que não mais lhe oferece a consolação da queda dos poderosos e a oportunidade de substituí-los. A degradação geral chega finalmente a um limite. Quando um piparote aleatório faz desabar o castelo de cartas, que poderia ter desabado muito antes, descobre-se uma paisagem pós-comunista mafiosa e semi-indolente, esgotada em sua energia.<br />Na China, os sobreviventes dos expurgos maoístas tomaram um caminho diferente. As necessidades do poder puro se misturaram aos cuidados de desenvolver o poder da China enquanto tal, e o comunismo morto é infiltrado pelo nacionalismo vivo. Contemporâneos da decadência do sovietismo, eles lamentaram ter seguido um modelo errado de desenvolvimento, enquanto que outras partes do mundo chinês, e em sua periferia, tinham seguido um outro modelo, melhor. Daí o caráter ambíguo da China atual, em pleno desenvolvimento, mas sem que o partido abandone seu projeto e sem que se saiba se esse partido é ainda comunista. As circunstâncias fizeram com que restasse apenas um regime comunista puro que, até hoje, preferiu a lógica do auto-aniquilamento: a Coréia do Norte.<br />Não sabemos como teria evoluído o nazismo. Ele não chegou ao seu clímax, pois foi derrubado nos primeiros passos da sua expansão. Ele se voltou para a realidade externa antes de ter terminado com a sociedade alemã. Enquanto a URSS preferiu a subversão organizada, o desencorajamento programado do ‘inimigo externo’, e o Exército Vermelho chegando somente para selar a vitória política, o nazismo recorreu imediatamente à guerra. A guerra acelerou de modo formidável o programa nazista, mas suscitando uma resistência mundial rapidamente vitoriosa.<br />As características do nazismo permitem eventualmente imaginar que Hitler teria podido chegar a uma paz de compromisso, que lhe teria deixado uma área vasta e estável. Nesse caso, morto o Führer, o regime teria se comportado de forma análoga à do regime leninista.<br />Na usura e no fracasso dos regimes totalitários, o fator externo é inegavelmente importante. Ele foi decisivo no caso da Alemanha nazista, esmagada por vários exércitos. Em contrapartida, o mundo capitalista nunca constituiu perigo para os regimes comunistas. O nazismo aumentou a legitimidade do comunismo aos olhos do Ocidente. Durante a época da chamada ‘Guerra Fria’, a política do <em>roll back</em> foi imediatamente afastada em favor daquela do containment. Essa opção não impediu vastas expansões territoriais comunistas na Ásia, na África e até na América. Finalmente, o único ponto do mundo em que o comunismo foi derrubado da maneira como o foi o nazismo, por uma invasão maciça devidamente organizada, em meio, é verdade, a um concerto de protestos de algumas potências não comunistas, foi a minúscula ilha de Granada.<br /><br /><em>O texto acima foi extraído das páginas 65 a 80 do livro de Alain Besançon, <strong>A Infelicidade do Século</strong>, editora Betrand Brasil, 2000</em><br /><br /><strong>Nota:</strong><br /><br />(1) Sebastien Haffner, <em>Un Certain Adolf Hitler</em>, Paris, Grasset, 1979Cássio Marcelo de Melo Tuneshttp://www.blogger.com/profile/10357923622868867785noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-8380482.post-50930019954456990802007-04-28T11:27:00.000-07:002007-07-16T18:36:03.095-07:00Ainda o filme "300"Opa! Dei uma bobeada e só fiquei sabendo ontem (27 abril), por um aluno, de uma postagem neste blog que criticava os meus comentários do filme “300”. O post é de José Wagner Alcântara, advogado, e foi enviado no dia 16 de abril. O seu texto não é ofensivo e apenas mostra uma discordância de opinião, mas merece uma resposta em razão de seus equívocos. Abaixo em itálico partes do texto do José Wagner, seguidos dos meus comentários:<br /><br /><em>Certas cenas ficariam melhor em um vídeo game do que em um filme.</em><br /><br />Pode ser. Mas esse tipo de imagem ou de cena não é monopólio estético do videogame. Não há nenhum problema em seu uso pelo cinema, cuja “linguagem” está sempre aberta à inovação e adaptação.<br /><br /><em>Não tem contexto histórico. Quer alçar-se à categoria de épico, mas não passa de uma história em quadrinhos. É um engodo tanto quanto o tal de Código da Vince, que alguns ingênuos ainda hoje teimam em achar que é uma pesquisa científica séria.</em><br /><br />Uai? Como não tem contexto histórico? Segundo Heródoto, Diodoro e a tradição historiográfica clássica, a Grécia foi invadida pelo império persa com um grande exército comandado pessoalmente pelo imperador Xerxes; os espartanos e outros gregos enfrentaram, em desvantagem numérica, os persas nas Termópilas; o rei Leônidas de Esparta comandou os gregos na batalha das Termópilas, acompanhado por um grupo de 300 espartanos; durante dois dias os gregos conseguiram deter os invasores, inclusive a elite dos “Imortais” persas; um grego chamado Efialtes revelou aos persas um caminho alternativo para cercar os gregos; Leônidas resolveu permanecer no local e lutar bravamente contra os invasores para atrasá-los na invasão o máximo possível; Leônidas e praticamente todos espartanos morreram no terceiro dia lutando contra os persas; tempos depois, o exército persa foi derrotado pelos gregos, sob o comando dos espartanos, na Batalha de Platéia. Portanto, EM SUAS LINHAS GERAIS, O FILME É SIM FIEL AO QUE ACONTECEU. É verdade que ele omitiu parte da história e inventou outras coisas, mas SUBSTANCIALMENTE ELE TEM CONTEXTO HISTÓRICO. Como não? Se alguém duvida desse contexto, leia a obra de Heródoto (o episódio das Termópilas está no capítulo ou “livro” VII). Por outro lado, como já havia comentado neste blog, o filme nunca teve a intenção de ser uma reconstituição TOTALMENTE fiel ao que aconteceu. Ele é propositalmente uma transposição de uma história em quadrinhos para a tela – quadrinhos que, por sua vez, são uma adaptação livre dos acontecimentos reais. Nesse sentido, ele não é um engodo.<br /><br /><em>Ademais o senhor faz uma defesa muito veemente da violência, mas esparta é vista por muitos historiadores como um centro de tirania e opressão e atenas sim como o verdadeiro centro das boas tradições ocidentais.</em><br /><br />Eu não faço “uma defesa muito veemente da violência”. Apenas afirmo, como qualquer historiador conhecedor da Grécia antiga, que a sociedade e a política gregas eram violentas. Em primeiro lugar, porque os gregos utilizaram-se da escravidão e de outras formas de trabalho compulsório ou, para utilizar um termo mais familiar à área do José Wagner, da coerção jurídico-política – as leis e o Estado permitindo o trabalho forçado, dando ao senhor poder absoluto sobre o corpo do seu escravo (castigos físicos, exploração, humilhação). É verdade que nas antigas sociedades escravistas, como nas modernas, existiram leis que tentavam conter os abusos dos senhores. Mas elas não questionaram o uso da violência sobre os escravos, apenas alguns excessos dos senhores. Ainda assim, é duvidoso que essas “regulamentações” tenham sido rigorosamente seguidas.<br /><br />Contudo, a violência do mundo grego não era apenas resultado de uma cultura escravista que, na nossa tradição iluminista, seria considerada desumana. A violência também era decorrente de uma cultura guerreira, reforçada pela divisão da Grécia em cidades-estados rivais que disputavam terras, hegemonia e prestígio regional. A guerra, a possibilidade da guerra e a preparação para a guerra era algo natural para os gregos, muito mais do que para nós. A mais antiga obra literária da Grécia antiga (e, portanto, da civilização ocidental) trata da violência e da guerra – a Ilíada de Homero, ambientada na Guerra de Tróia, tendo como protagonistas os guerreiros Aquiles e Heitor. As três maiores obras de História escritas na Antiguidade são de autores gregos e tem como foco a guerra: a História de Heródoto (Guerras Greco-Persas), a História da Guerra do Peloponeso de Tucídides e a História de Políbio (Guerras Púnicas). Os gregos, sobretudo sua elite culta, tinham uma obsessão com a guerra. Os jovens eram educados escutando histórias militares, admirando guerreiros e se preparando para guerra. O apogeu da cultura clássica grega foi em Atenas na época de Péricles, que foi a época do imperialismo ateniense sobre outras cidades-estados. O imperialismo da culta e democrática Atenas desencadeou o mais violento conflito da história da Grécia – a Guerra do Peloponeso. Como os demais gregos, os atenienses cometeram atrocidades sobre seus inimigos, com um ódio e fúria que desmentem totalmente a visão romântica e idealista de que Atenas não tinha tradição guerreira ou não era violenta. Antes desse conflito, o espírito guerreiro ateniense já havia se destacado, e respeitosamente reconhecido pelos espartanos, durante as Guerras Greco-Persas, sobretudo na Batalha de Maratona (um massacre dos persas pelos atenienses) e na Batalha de Salamina.<br /><br />Em razão dessa tradição guerreira generalizada, o principal dos deveres da cidadania grega era o de prestar serviço militar – atividade fundamental para garantir a segurança e os interesses coletivos da comunidade de cidadãos. Isso não foi de forma alguma uma característica exclusiva de Esparta – foi uma característica de todas as cidades-estados, inclusive de Atenas. Nesse aspecto, a principal diferença entre Esparta e Atenas foi que na primeira o exército de cidadãos era permanente e profissional, e na segunda ele era convocado em época de guerra. Enquanto os espartanos eram soldados de tempo integral, o exército ateniense era uma milícia bem-preparada de camponeses, artesãos, comerciantes e aristocratas. Mas a preparação para guerra e a cultura guerreira era comum a ambas, embora obviamente muito mais acentuadas em Esparta. Exatamente porque era mais forte em Esparta, muita gente pensa equivocadamente que essa tradição guerreira inexistia em Atenas e que, portanto, os atenienses desconheceram a violência política, voltando-se para as artes, para a filosofia e para a construção da democracia. Na verdade, em Atenas, como nas outras cidades-estados gregas, a violência generalizada também era uma decorrência de questões de política interna, de lutas entre facções que disputavam o poder nas cidades-estados e da construção da cidadania. Os gregos inventaram uma palavra para esse conflito político interno marcado pela violência – <strong><em>stasis</em></strong>. A democracia ateniense nasceu em um ambiente de intensa violência política, de quase guerra civil entre os diversos segmentos da população livre. A <em>stasis</em> e a violência era algo tão marcante na política grega que virou um dos temas “clássicos” da filosofia política do período – a busca de um regime que assegurasse a “boa ordem” na cidade-estado. De fato, um dos temas mais intrigantes do estudo da Grécia antiga, sobretudo de Atenas, é a relação entre a violência, decorrente da escravidão e da tradição guerreira, e o desenvolvimento de uma cultura sofisticada, da cidadania e da democracia.<br /><br />Atenas foi, de fato, muito mais o “centro das boas tradições ocidentais” do que Esparta. A sociedade ateniense também foi relativamente menos militarista do que a espartana. Contudo, Atenas convivia com um grau de violência nas suas relações sociais, na sua política interna e na sua política externa que provavelmente não seria muito estranha a muitos dos países menos desenvolvidos da atualidade, mas certamente chocaria a opinião pública das nações mais prósperas e estáveis do Ocidente pós-1945. Além disso, falar que Esparta foi “um centro de tirania e opressão” em contraste com Atenas é deturpar a história. Ambas exploraram a mão-de-obra compulsória, só que em Esparta os trabalhadores oprimidos – os hilotas – lembravam mais os servos e, ao contrário dos escravos em Atenas, possuíam terras, famílias e não eram vendidos como propriedade privada dos espartanos. A mulher espartana possuía mais liberdade e influência do que a mulher ateniense. E a tirania foi um fenômeno político de Atenas e não de Esparta. Tudo isso pode ser encontrado em qualquer livro especializado na história da Grécia antiga: não é um tema esotérico, não é segredo de historiadores. Basta um pouco mais de atenção e seriedade para obter essas informações e tirar da cabeça uma visão deturpada e ingênua do passado.<br /><br />Para os interessados nessa questão da guerra, violência e escravidão na Grécia antiga sugiro as seguintes leituras: <strong><span style="color:#ff0000;">Guerra e Economia na Grécia Antiga</span></strong> de <strong>Yvon Garlan</strong> (Campinas, Papirus Editora, 1991), <strong><span style="color:#ff0000;">Por Que o Ocidente Venceu – Massacre e Cultura da Grécia Antiga ao Vietnã</span></strong> de <strong>Victor Davis Hanson</strong> (Rio de Janeiro, Ediouro, 1992), <strong><span style="color:#ff0000;">A Guerra do Peloponeso – Novas Perspectivas Sobre o Mais Trágico Confronto da Grécia Antiga</span></strong> de <strong>Donald Kagan</strong> (Rio de Janeiro, Record, 2006) e <strong><span style="color:#ff0000;">A Batalha de Salamina – O Combate Naval que Salvou a Grécia e a Civilização Ocidental</span></strong> de <strong>Barry Strauss</strong> (Rio de Janeiro, Record, 2007).Cássio Marcelo de Melo Tuneshttp://www.blogger.com/profile/10357923622868867785noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-8380482.post-5410268492675351132007-04-16T11:59:00.000-07:002007-04-22T05:24:32.535-07:003 Série: América Latina: a crise do liberalismo (1914-1945)<strong>CONTINUAÇÃO/Unidade 1 – A América Latina nos séculos XX-XXI<br /><br />1.2 América Latina: a crise do liberalismo (1914-1945)<br /><br />a) O contexto internacional<br /><br />Era das duas guerras mundiais (1914-1918 e 1939-1945)<br /><br />Fim da supremacia européia e da hegemonia britânica no mundo<br /><br />Ascensão dos EUA como principal potência econômica mundial<br /></strong><br /><strong>Formação da União Soviética a partir da Revolução de Outubro de 1917 na Rússia<br /></strong>– Revolução de Outubro de 1917: Revolução Bolchevique ou Comunista, de inspiração marxista, liderada por Lênin.<br />– Nascimento do socialismo (economia estatizada com ditadura do partido comunista em nome do proletariado)<br />– Forneceu o modelo de intervencionismo estatal e de planificação econômica visando à modernização e industrialização<br />– Difundiu o ideal do socialismo de linha marxista-leninista, sobretudo com a criação do <strong>Comintern</strong> ou <strong>Terceira Internacional</strong> (1919-1943): organização internacional de partidos comunistas dirigida pelo PCUS (Partido Comunista da União Soviética), visando expandir a revolução socialista pelo mundo.<br /><br /><strong>Criação da Liga das Nações:</strong> organização internacional reunindo a maioria dos países com o objetivo de garantir a paz mundial por meio da segurança coletiva, possibilitando a cooperação nos campos político, econômico e cultural.<br /><strong><br />Crise geral do capitalismo:</strong> iniciada pelos problemas gerados pela Primeira Guerra Mundial (superados parcialmente em 1922-1928) e agravada com a <strong>Grande Depressão Mundial</strong> de 1930-1939 a partir do “Crack da Bolsa de Valores de Nova York” (1929): falências, desemprego em massa, retração do comércio e queda dos investimentos internacionais.<br /><br /><strong>Crise do liberalismo:</strong> ascensão de regimes estatizantes (dirigismo econômico) inspirados em ideologias antiliberais coletivistas como o marxismo, o trabalhismo, o corporativismo ou o nacionalismo radical.<br /><br />■ <strong>Marxismo –</strong> defesa da abolição do capitalismo e da instalação do socialismo (economia estatizada em nome dos trabalhadores) fundamentada na crença na luta de classes, na tomada do poder pelo proletariado organizado em um partido operário (comunista, socialista), na instalação da ditadura do proletariado (governo do partido operário) para estatizar a economia e na cooperação entre partidos operários de vários países para propagar a revolução socialista mundial (internacionalismo revolucionário).<br /><br />■<strong>Trabalhismo –</strong> defesa de uma legislação social no capitalismo com amplos direitos para os trabalhadores, pressupondo uma forte intervenção estatal nas relações entre empregados e empregadores, o aumento das atribuições do Estado, dos gastos públicos e da carga tributária.<br /><br />■ <strong>Corporativismo –</strong> defesa da organização da sociedade capitalista em agrupamentos profissionais ou corporações (reunião de sindicatos e associações de empregados, profissionais liberais ou patrões) controladas por um Estado autoritário em nome da coesão nacional.<br /><br />■ <strong>Nacionalismo radical –</strong> em termos econômicos, preconiza a intervenção estatal no capitalismo para incentivar a modernização ou industrialização (subsídios, protecionismo alfandegário, investimentos públicos na infra-estrutura, estatização de alguns setores estratégicos), inspirada no ideal da autarquia (auto-suficiência), visando eliminar ou reduzir a dependência estrangeira. Em geral, essa idéia resultou na instalação de ditaduras supostamente representantes dos interesses nacionais. Nos casos mais extremos, implicou numa intensa militarização e no imperialismo sob a justificativa de fortalecer e engrandecer a nação.<br /><br />De uma maneira geral, surgiram dois tipos de regimes estatizantes:<br /><br /><strong>Ditatoriais:</strong> como o socialismo ou “comunismo” na Rússia/União Soviética, o fascismo na Itália e o nazismo ou nacional-socialismo na Alemanha.<br />– Na URSS o capitalismo e o liberalismo foram extintos pelo socialismo marxista.<br />– Na Itália e na Alemanha o liberalismo foi sufocado, mas o capitalismo foi preservado sob o fascismo/nazismo, um sistema político ditatorial que combinou o nacionalismo radical, o antimarxismo, o corporativismo e o trabalhismo.<br />– Os regimes antiliberais da URSS, Alemanha nazista e Itália fascista costumam ser classificados como <strong>totalitários</strong> (ditaduras de partido único em nome de uma coletividade com pretensões de criar uma nova sociedade ou um novo homem e expandir sua ideologia).<br /><br /><strong>Democráticos:</strong> o Welfare State ou Estado do Bem-estar Social capitalista que começou a ser instalado na Europa Ocidental com a social-democracia e nos EUA com o New Deal do presidente Franklin Roosevelt (1933-1945), combinando o liberalismo político com o trabalhismo.<br /><br /><strong>b) O contexto latino-americano</strong><br /><br /><strong>Crise da economia agro-exportadora:<br /></strong>– Gerada pela retração do comércio mundial durantes as guerras mundiais e, principalmente, pela Grande Depressão, embora na década de 1920 tenha havido uma breve fase de prosperidade.<br />– Os investimentos estrangeiros também diminuíram<br />– Dificuldades no pagamento da dívida externa<br /><br /><strong>Crise dos regimes oligárquicos liberais</strong><br />– Aumento da pressão dos grupos urbanos por reformas políticas e econômicas<br />– Declínio do liberalismo e avanço das idéias intervencionistas e coletivistas, sobretudo de linha autoritária nacionalista.<br />– O marxismo avançou entre os intelectuais e no movimento operário (influência do Comintern), substituindo o anarquismo.<br /><br /><strong>Início do populismo.</strong> Movimento e regime político com as seguintes características:<br />– mobilização das massas trabalhadoras por um líder carismático;<br />– nacionalismo econômico;<br />– reformas trabalhistas;<br />– manipulação ou controle dos sindicatos;<br />– na maior parte dos casos, ausência de um partido político forte, refletindo-se em uma ação política mais personalista (na figura do líder) do que partidária, e num relativo desprezo pelas instituições (legislativo, judiciário), com uma tendência ao autoritarismo, buscando a conciliação entre as classes.<br />O populismo latino-americano é um fenômeno político altamente debatido pelos historiadores e outros cientistas sociais, objeto de uma grande polêmica. Para alguns ele seria uma corrente não-marxista e reformista da esquerda latino-americana, outros o vêem como algo próximo do fascismo (a fronteira entre o socialismo e o fascismo nunca foi muito clara) e outros o consideram como uma adaptação de interesses oligárquicos a uma sociedade em rápida transição para a modernidade. O que não resta dúvida é que a mobilização popular feita pelo populismo foi vista como uma ameaça ao poder dos grupos políticos tradicionais, ao passo que o seu nacionalismo econômico implicou num desafio aos interesses do capital estrangeiro, sobretudo do norte-americano. Os maiores representantes do populismo latino-americano foram, no Brasil, <strong>Getúlio Vargas </strong>(entre 1930 e 1954) e <strong>João Goulart</strong> (herdeiro do populismo getulista em 1954-1964); no México, <strong>Lázaro Cárdenas</strong> (1934-1940) e, na Argentina, <strong>Juan Perón</strong> (entre 1943 e 1974).<br /><br /><strong>Impulso à industrialização<br /></strong>Fatores favoráveis:<br />- Dificuldades comerciais geradas pelas guerras mundiais e pela Grande Depressão (redução das importações implicando na política de “substituição de importações”)<br />- Ascensão do populismo<br />- Crescente influência do nacionalismo econômico<br />Características: industrialização com forte apoio governamental sem excluir investimentos estrangeiros, sobretudo depois de 1945, na forma da instalação de multinacionais; ideal de uma produção voltada para o mercado interno (busca da auto-suficiência) com baixa competitividade internacional.<br />Embora no final do período (1945) a América Latina continuasse ainda com uma economia baseada na exportação de matérias-primas, o impulso à industrialização havia sido acelerado no Brasil, México e Argentina.<br /><br /><strong>c) Os EUA e a América Latina<br /><br />Afirmação da hegemonia americana na região</strong><br />EUA substituiu a Grã-Bretanha como principal parceiro comercial e investidor na América Latina, consolidando os objetivos estratégicos e políticos da Doutrina Monroe.<br /><br /><strong>Gradual abandono da prática de intervenção militar americana no Caribe e América Central:</strong><br />– Revisão do Corolário Roosevelt e da Diplomacia do Dólar pelos presidentes Calvin Coolidge (1923-1929) e Herbert Hoover (1929-1933): melhorar a imagem dos EUA na América Latina, cortar gastos com intervencionismo e ampliar os negócios americanos na região.<br />– Inicialmente substituída pelo apoio às ditaduras no Caribe e América Central que garantissem a estabilidade política e os interesses econômicos americanos. Exemplos: ditaduras de <strong>Rafael Trujillo</strong> na República Dominicana (1930-1961), <strong>Fulgêncio Batista</strong> em Cuba (1934-1958) e <strong>Anastásio Somoza</strong> na Nicarágua (1936-1956).<br /><br /><strong>Política da Boa Vizinhança de Franklin Roosevelt (1933-1945):</strong> foi a consolidação da nova política americana para a América Latina<br />– Baseada no ideal de não-intervenção militar na região e de tolerar divergências com os governos vizinhos, paralelamente ao fortalecimento dos laços diplomáticos e comerciais entre EUA e América Latina em uma estrutura regional de pan-americanismo.<br />– A influência americana foi ampliada por meio da assistência econômica e do investimento de capital privado (exemplo: criação do Export-Import Bank em 1934 para financiar as compras de produtos americanos; tratados comerciais).<br /><br /><strong>Problema para a hegemonia americana no Hemisfério Ocidental na década de 1930:</strong> as investidas diplomáticas e econômicas da Alemanha nazista.<br />– A estratégia americana: fortalecer o pan-americanismo utilizando o discurso de cooperação, democracia, integração econômica e não-envolvimento nos problemas europeus.<br />– 1936. Conferência Pan-Americana de Buenos Aires: compromisso de consulta mútua entre EUA e países latino-americanos em caso de ameaça à paz no continente.<br />– 1939. Conferência Pan-Americana do Panamá: necessário erradicar da América as doutrinas estrangeiras não-democráticas.<br />– 1942, janeiro. Conferência do Rio de Janeiro (Reunião de Consulta dos Ministros de Relações Exteriores dos países americanos): solidariedade hemisférica com os EUA, que haviam entrado na Segunda Guerra Mundial em dezembro de 1941. A maioria dos países da América Latina rompeu relações diplomáticas com o Eixo (Alemanha, Itália e Japão).<br /><br /><strong>d) A Revolução Mexicana (1910-1920)</strong><br /><br />A Revolução Mexicana foi um violento movimento político e social, o maior levante das massas trabalhadoras da história da América Latina pós-independência. Apesar de envolver setores das elites mexicanas e diversos grupos urbanos, ela teve nos camponeses a sua principal base social. Seu conteúdo ideológico foi democrático e nacionalista, com a presença de idéias socialistas e anarquistas, ainda que não tenham prevalecido. De fato, a Revolução Mexicana ficou nos limites de uma “revolução burguesa” – radical e popular, mas que resultou, ainda assim, na construção de um Estado favorável ao capitalismo.<br /><br /><strong>d.1 As origens da revolução<br /></strong><br /><strong>■ O “porfiriato” (1876-1911).</strong> Depois de meio século de instabilidade política, guerra civil e intervenções militares estrangeiras que se seguiram á independência, o México viveu um período de mais de 30 anos de paz e relativa prosperidade sob o governo do general <strong>Porfírio Díaz</strong> (1876-1880 e 1884-1911). Díaz instalou uma ditadura e manteve-se no poder por meio da fraude eleitoral e da violência, reprimindo a oposição.oposiçmindo a Auxiliado por assessores chamados de “científicos”, Díaz adotou um programa de modernização: construção de ferrovias, linhas telegráficas, criação de indústrias e estímulo aos investimentos estrangeiros (destacando-se o americano), sobretudo no setor petrolífero. No meio rural, buscou desenvolver a agricultura capitalista favorecendo a ocupação das antigas terras coletivas das comunidades camponesas indígenas pelos grandes proprietários. O resultado dessa política econômica foi o aumentou a concentração de renda no México, beneficiando os latifundiários, banqueiros e industriais.<br /><br /><strong>■ A insatisfação com o porfiriato e as eleições de 1910.</strong> Os efeitos da modernização capitalista, combinados com uma estrutura política autoritária e excludente geraram um grande descontentamento entre vários grupos sociais: os camponeses ressentiam-se da perda das terras coletivas, o crescente proletariado industrial estava insatisfeito com a ausência de direitos trabalhistas, a classe média desejava participação política e setores da própria elite econômica discordavam da concentração de poder nas mãos de Díaz por um período tão longo. Foi nesse contexto que, em 1908, Díaz deu a entender que aceitaria a democratização do país a partir das eleições presidenciais de 1910. <strong>Francisco Madero</strong>, um rico empresário defensor de reformas sociais, emergiu, então, como principal líder da oposição ao porfiriato. A campanha eleitoral de Madero ganhou popularidade, assustando os porfiristas (as elites econômicas conservadoras). Em junho de 1910, Madero foi preso acusado de incitação à rebelião e Díaz foi reeleito presidente fraudando as eleições.<br /><br /><strong>■ A opção revolucionária.</strong> Libertado em julho, Madero fugiu para os EUA e, em outubro, lançou o Plano de San Luís de Potosí, exigindo democracia e a restituição das terras dos camponeses – um plano que se transformou na plataforma da Revolução Mexicana. A proposta agrária de Madero, principalmente, foi fundamental para mobilizar os camponeses e desencadear a revolução popular. Com efeito, Madero e seus aliados concluíram que a única maneira de levar adiante seu plano era a derrubada de Díaz por meio da luta armada. Os revolucionários programaram a insurreição para novembro de 1910.<br /><br /><strong>d.2 Características e etapas da revolução</strong><br /><br />A Revolução Mexicana não foi um movimento uniforme e seus partidários não possuíram os mesmos ideais, a não ser, inicialmente, derrubar Díaz. Ela caracterizou-se por uma série de lutas políticas numa longa guerra civil que combinou levantes camponeses, insurreições operárias e disputas pelo poder entre facções rivais das camadas dirigentes. A instabilidade política e as ameaças aos interesses americanos no México geradas pela revolução resultaram também na intervenção militar dos EUA. Diversas lideranças populares emergiram no processo revolucionário, destacando-se o camponês <strong>Emiliano Zapata</strong> (influenciado pelas idéias do anarquista Ricardo Flores Magón) e o bandido <strong>Pancho Villa</strong>. Ambos, sobretudo o primeiro, são até hoje ícones da esquerda latino-americana.<br /><br /><strong>■ A derrubada de Díaz (1910-1911).</strong> A luta armada contra Díaz começou em novembro de 1910. As forças de Madero, partindo dos EUA, invadiram o México. No norte, Pancho Villa chefiou um levante de trabalhadores rurais e da mineração marginalizados, enquanto no sul, no estado de Morelos, camponeses indígenas liderados por Emiliano Zapata – organizados no ELS ou Exército Libertador do Sul – fizeram uma insurreição exigindo a devolução das terras comunais. As forças governamentais não conseguiram deter o avanço dos rebeldes e, em maio de 1911, Díaz renunciou e exilou-se na Europa.<br /><br /><strong>■ O governo de Madero (1911-1913).</strong> Com a queda de Díaz, o governo foi assumido interinamente pelo conservador Francisco Leon de la Barra (maio-novembro 1911). Novas eleições foram realizadas e Madero foi eleito presidente. A vitória de Madero não encerrou a revolução. Díaz havia caído, mas o aparelho de Estado porfirista continuou intacto, com sua burocracia e militares reacionários. As elites econômicas partidárias do velho ditador aguardavam a oportunidade para recuperarem o poder. Por outro lado, os grupos revolucionários mais radicais, representados por Zapata e seus camponeses, exigiam uma rápida transferência maciça de terras dos latifundiários. Madero, cuja concepção de democracia era limitada e mais próxima de uma oligarquia liberal, não possuía solução para esses problemas. Seu governo fez algumas reformas no campo trabalhista, permitindo a organização de sindicatos e o direito a greve, mas ele não atendeu os zapatistas e tentou reprimir o seu movimento, sem sucesso. Madero ficou enfraquecido e, em fevereiro de 1913, foi derrubado por um golpe militar encabeçado pelo general porfirista <strong>Victoriano Huerta</strong>, apoiado pelo embaixador dos EUA. Alguns dias depois do golpe, Madero foi assassinado.<br /><br /><strong>■ O governo de Victoriano Huerta (1913-1914).</strong> Huerta assumiu a presidência em eleições fraudulentas e instalou uma ditadura contra-revolucionária, que acabou perdendo o apoio dos EUA. A guerra civil se intensificou com o crescimento das forças revolucionárias, unidas na luta contra Huerta. Zapata e Villa juntaram-se a <strong>Venustiano Carranza</strong>, antigo ministro da Guerra de Madero, que organizou o Exército Constitucionalista, comandado pos <strong>Álvaro Obregón</strong>. A situação de Huerta ficou insustentável em 1914 quando os EUA tomaram a cidade de Vera Cruz, para proteger interesses americanos locais, privando o governo mexicano do seu principal porto importador de armas. Com as forças revolucionárias avançando rapidamente, Huerta renunciou em julho de 1914 e fugiu do país.<br /><br /><strong>■ O governo de Carranza (1914-1920).</strong> Com a queda de Huerta, a coalizão revolucionária foi rompida e a guerra civil continuou. Villa e Zapata ocuparam a Cidade do México (novembro 1914 – janeiro 1915), forçando Carranza e Obregón – os Constitucionalistas – a se transferirem para Vera Cruz (Carranza oficialmente ainda não era o presidente). Contudo, os villistas e zapatistas não conseguiram elaborar um programa comum que atendesse os interesses dos camponeses e do proletariado urbano. Os Constitucionalistas, ao contrário, adotaram um plano de reformas sociais com decretos de distribuição de terras e melhorias nas condições dos trabalhadores industriais. A balança de forças favoreceu os Constitucionalistas e a Cidade do México foi tomada por eles (janeiro de 1915, embora o controle definitivo só tenha sido alcançado em abril). Em seguida, os grupos rebeldes radicais sofreram dois duros e decisivos golpes: no norte, em abril-julho de 1915, no mais sangrento confronto armado da revolução – a Batalha de Celaya – Obregón derrotou o exército de Villa, que nunca mais conseguiu se recuperar (em 1916, Villa ainda teve forças para atacar o sul dos EUA, desencadeando uma intervenção militar americana que inutilmente tentou captura-lo); em abril de 1919, Zapata foi morto pelas forças governamentais, levando seu exército a se dissolver. Antes da morte de Zapata, porém, Carranza promulgou a <strong>Constituição de 1917</strong>, em vigor até hoje: o México virou uma república democrática, direitos trabalhistas foram garantidos, a atuação do capital estrangeiro foi restringida e a propriedade da terra limitada. Na época, foi considerada a constituição mais progressista (no sentido dado pela esquerda) do mundo, mas ela não foi socialista. Com um conteúdo claramente nacionalista e reformista, ela favoreceu o desenvolvimento do capitalismo nacional mexicano, limitando, mas não obstruindo, os investimentos estrangeiros. Para alguns historiadores, a constituição marcou o término da revolução. Carranza, contudo, resistiu em aplicar os artigos reformistas da constituição e seu governo deu uma guinada para a direita em 1917-1920. Na definição da sua sucessão, ele perdeu o importante apoio de Obregón, que organizou uma rebelião militar. Carranza fugiu da Cidade do México em maio de 1920, com uma grande quantidade de ouro e prata do tesouro nacional, mas acabou assassinado durante a fuga.<br /><br /><strong>■ O governo de Obregón (1920-1924).</strong> Carranza foi sucedido interinamente por Adolfo de la Huerta e, nas eleições de setembro de 1920, Obregón saiu vitorioso, como esperado. Seu governo foi marcado pela reconstrução de um país devastado por uma guerra civil que havia matado cerca de 1 milhão de pessoas. A reforma agrária começou a ser feita lentamente e os trabalhadores estimulados a se sindicalizar, fortalecendo a Confederação Regional Operária Mexicana (CROM), a principal organização sindical. Apesar da retórica do seu governo possuir um contudo nacionalista e anti-capitalista, Obregón cultivou boas relações com os EUA e favoreceu a expansão do capitalismo mexicano. Fundamental para o desenvolvimento do nacionalismo do regime revolucionário foi a valorização e idealização do passado indígena, sobretudo asteca, do México, que resultou no culto do indigenismo.<br /><br /><strong>■ A consolidação da revolução (1924-1940).</strong> No final do seu governo, Obregón sufocou um levante armado de grupos contra-revolucionários (1923) e conseguiu garantir a vitória do seu candidato, <strong>Plutarco Elias Calles</strong>, nas eleições de 1924 (em 1928, Obregón venceu as eleições para a sucessão de Calles, mas foi em seguida assassinado por um seminarista contrário a sua política anti-clerical). Calles governou em 1924-1928 e continuou sendo o homem forte da política mexicana nos mandatos de Emilio Portes Gil (1928-1930), Pascual Ortiz Rubiu (1930-1932) e Abelardo Rodrigues (1932-1934). Sua principal obra na consolidação do regime revolucionário foi a fundação do <strong>Partido Nacional Revolucionário</strong>, em 1929 (mudou de nome para Partido da Revolução Mexicana, em 1938, e definitivamente para <strong>Partido Revolucionário Institucional</strong> ou <strong>PRI</strong>, em 1946) que monopolizou o poder no México até 1998 (no legislativo) e 2000 (na presidência). Em 1934-1940 o México foi governado por <strong>Lázaro Cárdenas</strong>, considerado o mais importante e popular presidente do país no século XX. Cárdenas fez a maior reforma agrária do regime, distribuindo 18 milhões de hectares de terras a 750 mil famílias – o dobro de todos os governos anteriores. Seu governo também apoiou as reivindicações salariais do operariado, entrando em confronto com as empresas estrangeiras. Em conseqüência, ele nacionalizou o sistema ferroviário (1937) e o petróleo (1938), levando a criação da poderosa estatal Pemex (Petróleos Mexicanos), que serviu de modelo para outras nações em desenvolvimento. Apesar dessa medida prejudicar o capital americano, que dominava o setor petrolífero, o presidente dos EUA, Franklin Roosevelt, resistiu às pressões das companhias do seu país que queriam uma intervenção militar contra Cárdenas. Defensor de uma diplomacia de aproximação com as nações latino-americanas – a Política de Boa-Vizinhança – em uma época em que o mundo caminhava para a Segunda Guerra Mundial, Roosevelt preferiu aceitar as medidas nacionalistas de Cárdenas, cuja popularidade aumentou ainda mais.Cássio Marcelo de Melo Tuneshttp://www.blogger.com/profile/10357923622868867785noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8380482.post-17712831560037259322007-04-11T11:40:00.000-07:002007-04-20T03:49:50.048-07:002 Série - Revolução Haitiana: enciclopédia virtualPara os interessados em mais detalhes da Revolução Haitiana (1791-1804), há uma ótima enciclopédia virtual sobre o assunto em <a href="http://thelouvertureproject.org/index.php?title=Main_Page">http://thelouvertureproject.org/index.php?title=Main_Page</a>. Está em inglês.Cássio Marcelo de Melo Tuneshttp://www.blogger.com/profile/10357923622868867785noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8380482.post-2693801183879720212007-04-09T17:07:00.000-07:002007-04-09T17:11:08.941-07:00A direita brasileira por Olavo de CarvalhoLeiam o ótimo texto do <span style="color:#3333ff;"><strong>Olavo de Carvalho</strong></span> sobre a direita política e o conservadorismo no Brasil em <a href="http://www.olavodecarvalho.org/semana/070409dc.html">http://www.olavodecarvalho.org/semana/070409dc.html</a><br />Abaixo, a parte inicial desse texto:<br /><br /><strong>A direita a serviço da esquerda<br /></strong><br />Dentre as muitas coisas verdadeiras ditas pelo sr. Fernando Henrique Cardoso entre uma mentira e outra, esta merece a maior atenção:<br /><br /><em>"Não existe direita no Brasil, no sentido clássico do conceito... O pensamento conservador filia-se a uma tradição ocidental que estabelece como pilares da ordem a família, a propriedade, os costumes. O nosso conservadorismo não é nada disso. Tem a ver com clientelismo, patrimonialismo, uso indevido dos recursos do Estado. Ele não é composto de um ideário, e sim de aproveitadores. Por que a 'direita', no Brasil, apóia todos os governos, não importa qual? Na história recente, ela apoiou os militares, apoiou o Sarney, apoiou o Collor, apoiou a mim, apóia o Lula. Porque seus integrantes não são de direita. Essa gente toda só quer estar perto do Estado, tirar vantagens dele." </em><br /><br />Só faltou ele acrescentar – e por isso acrescento eu – que esse é o mais grave problema do Brasil. Desde logo, só a economia capitalista pode gerar prosperidade, mas o sucesso dessa economia depende diretamente da conduta da classe capitalista. Ora, é precisamente a essa classe que o ex-presidente se refere. Se ela própria insiste em se tornar dependente do Estado, por interesses imediatistas e pela relutância covarde em se expor plenamente aos riscos da livre concorrência, ela condena o capitalismo brasileiro à atrofia perpétua. Não tem sentido um sujeito prosternar-se ante a autoridade governamental e depois reclamar que ela o oprime com sobrecarga de impostos e de exigências burocráticas. Se você quer independência, tem de agir com independência. No Brasil os ricos gritam "Enxuguem o Estado!", mas querem continuar nadando na piscina das verbas oficiais. Assim não dá.<br /><br />Mas os efeitos da subserviência capitalista ao Estado vão muito além da esfera econômica. O exemplo da classe rica se propaga por toda a população e a corrompe, fazendo de cada cidadão um virtual pedinte de dinheiro público. O brasileiro não sonha em enriquecer com trabalho, poupança e investimento, mas em chegar o mais rápido possível à aposentadoria. E ele não pensa assim por ser preguiçoso, mas porque sua poupança é comida pelos impostos e a única forma de investimento que resta ao seu alcance são as contribuições previdenciárias. O Brasil não é uma potência capitalista porque preferiu ser antes um imenso Instituto de Previdência. Os efeitos psicológicos dessa situação são devastadores: se o objetivo da vida é a aposentadoria, o trabalho não é o caminho da prosperidade e da auto-realização, mas uma incomodidade temporária que deve ser removida o mais rápido possível. Então o desleixo e a incompetência tornam-se não apenas direitos, mas até deveres: como o trabalho não tem nenhuma outra finalidade senão ser abolido o quanto antes, o trabalhador esforçado é visto como um vaidoso pedante ou como um puxa-saco do patrão.<br /><br /><strong>Olavo de Carvalho</strong> <em>in</em> <em><strong>Diário do Comércio</strong></em>, 09 de abril de 2007Cássio Marcelo de Melo Tuneshttp://www.blogger.com/profile/10357923622868867785noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8380482.post-81221322773803852942007-04-03T02:19:00.000-07:002007-04-20T03:53:58.722-07:002 Série - EUA e América Latina (1870-1914)<strong>Os fundamentos ideológicos da política externa americana:</strong><br /><strong></strong><br />A herança do calvinismo: EUA como a “Terra Prometida” (a “Nova Jerusalém”) e os americanos como o “povo eleito”, com um regime político e econômico superior ao do Velho Mundo – um modelo para a humanidade (democracia, liberdade individual, capitalismo, prosperidade econômica). Gerou dois impulsos contraditórios da política externa:<br /><br />■ <strong>Isolacionismo e neutralidade:</strong> baseados na idéia da excepcionalidade dos EUA (suas idéias e instituições políticas eram únicas e não poderiam florescer em outras partes do mundo).<br /><br />■ <strong>Internacionalismo e ativismo:</strong> baseados na idéia da missão sagrada e civilizadora dos EUA (propagar seu sistema político e econômico pelo mundo – o “evangelho da democracia”).<br /><br /><strong>As bases da política externa americana para a América Latina:<br /></strong><br />Reduzir e restringir a influência da Europa na região e estabelecer a hegemonia americana: ideal de liderança política no Hemisfério Ocidental (as Américas), alicerçada na superioridade econômica e militar e fundamentada na <strong>Doutrina Monroe.</strong><br /><br /><strong>Fase da expansão territorial dos EUA na América (1800-1870):</strong> compra da Louisiana (França), da Flórida (Espanha) e do Alasca (Rússia), anexação do Texas e do norte do México (oficialmente comprado), legitimadas pela ideologia do <strong>Destino Manifesto.<br /></strong><br /><strong>Fase do império comercial dos EUA na América (1870 em diante):</strong> criação de uma “esfera de interesses” no continente por meio de relações econômicas e políticas visando a hegemonia. Razões dos EUA desistirem de novas conquistas territoriais (exceção Porto Rico, Havaí e Samoa e parte do Panamá): (I) países latino-americanos densamente povoados e impróprios para a imigração anglo-saxônica (racismo, preconceito cultural); (II) ênfase nas vantagens comerciais em lugar das aquisições territoriais; (III) impérios coloniais custavam caro em termos administrativos e militares.<br /><br /><strong>Obstáculos para a hegemonia dos EUA na América Latina em 1870-1914:</strong> (I) domínio colonial europeu no Caribe; (II) visão preconceituosa da América Latina (inferioridade racial, cultura retrógrada de base católica e de tradições ibéricas autoritárias e burocráticas, clima tropical desestimulando o trabalho e o esforço pessoal).<br /><br /><strong>Estratégias dos EUA na América Latina em 1870-1914:</strong> (I) desafiar e afastar o poder europeu do Caribe; (II) aproximar-se dos países latino-americanos por meio da ideologia da solidariedade hemisférica e do pan-americanismo (cooperação, aliança e integração dos países americanos); (III) intervenções militares e protetorados no Caribe, América Central e México para assegurar os interesses americanos. Essas intervenções foram feitas até a década de 1930 e implicavam no controle e regularização das finanças públicas caóticas e no estabelecimento de eleições presidenciais, favorecendo as oligarquias aliadas dos EUA.<br /><br /><strong>A Guerra Hispano-Americana (1898)</strong><br /><br />No final do século XIX, a Espanha era uma potência decadente que possuía como principais colônias Cuba e Porto Rico, no Caribe, as Filipinas no Extremo Oriente e Guam no Pacífico. Todos esses territórios eram alvos das ambições dos grupos imperialistas americanos que, entre outros argumentos, baseavam-se na idéia do Destino Manifesto – o direito e a inevitabilidade histórica dos EUA à expansão pela América e Pacífico. Cuba, em especial, recebera muitos investimentos dos EUA nos setores açucareiro e de serviços. Por esse motivo, e devido à proximidade geográfica da Flórida, ela era vista por muitos americanos (e cubanos) como um país de destacada importância estratégica e econômica que deveria ficar sob o controle formal ou informal dos americanos. Quando os cubanos pegaram em armas contra a dominação espanhola na <strong>Guerra da Independência Cubana</strong> (1895-1898), as relações dos EUA com a Espanha deterioram rapidamente. Os interesses americanos estavam sendo prejudicados pela violência do conflito e muitos cobraram do presidente <strong>William McKinley</strong> (1897-1901) a aplicação da Doutrina Monroe contra a Espanha. A misteriosa <strong>explosão do encouraçado americano Maine</strong>, ancorado no porto de Havana (fevereiro 1898), matando 260 tripulantes, agravou a crise entre os dois países. A opinião pública americana, instigada pela imprensa e pelos grupos imperialistas, acusou os espanhóis de serem os responsáveis pelo fato. Em abril de 1898 os EUA reconheceram a independência de Cuba (e com a <strong>Emenda Teller</strong> afirmaram que não tinham interesse em anexar a ilha) e entraram em guerra com a Espanha. Rapidamente os EUA venceram a <strong>Guerra Hispano-Americana</strong> (abril-julho 1898) – ”uma pequena esplêndida guerra”, segundo o Secretário de Estado John Hay – e tomaram dos espanhóis as Filipinas, Guam e Porto Rico. Cuba ficou independente mas com sua soberania limitada de tal maneira que, na prática, ela virou um protetorado ou semi-colônia dos EUA. Pela <strong>Emenda Platt</strong> (1901) à constituição cubana, imposta pelos americanos, Cuba não podia assinar tratados ou fazer concessões a outros países sem a autorização dos EUA. Além disso, os americanos tinham o direito de intervir na ilha para manter a lei e a ordem. Os EUA também adquiriram uma <strong>base militar em Guantánamo</strong>. A Emenda foi revogada em 1934, mas a base militar continua até hoje sob controle americano.<br /><br /><strong>O Big Stick</strong><br /><br />O imperialismo americano ganhou outro impulso no governo de <strong>Theodore Roosevelt</strong> (1901-1909), que adotou adaptou a Doutrina Monroe com o <strong>Corolário Roosevelt</strong>, apelidado de Política do <strong>Big Stick</strong> ou Grande Porrete – o direito de intervenção dos EUA na América Latina para garantir a estabilidade e proteger os interesses americanos. Ele tentou romper com a tradicional política externa de isolacionismo americano e ampliou a marinha de guerra do país, com o objetivo de dominar o Pacífico e o Caribe. A sua ação mais famosa foi a <strong>intervenção no Panamá</strong> (1903), país que era parte da Colômbia. No final do século XIX, os franceses foram autorizados a construir um canal no Panamá ligando o Pacífico ao Atlântico, encurtando a navegação entre os dois oceanos. O empreendimento francês fracassou (milhares de operários morreram de malária e febre amarela tentando construí-lo) e, em 1903, Roosevelt fez um acordo com a Colômbia para concluir a obra, em troca do direito dos americanos controlarem o canal por meio de um pagamento anual de arrendamento. Contudo, o Senado colombiano rejeitou o tratado. Quando os panamenhos revoltaram-se contra a Colômbia desejando a independência, Roosevelt imediatamente apoiou o movimento, enviando navios e fuzileiros navais que impediram os colombianos de reprimirem a revolução separatista. O Panamá ficou independente e assinou com os EUA o tratado para a construção do canal, feita em 1907-1914, garantindo o seu controle pelos americanos, e das terras adjacentes (a Zona do Canal), em troca de um arrendamento perpétuo. No entanto, o crescimento da hostilidade popular panamenha, de base nacionalista e anti-americana, na segunda metade do século XX, levou os EUA a reverem os termos do tratado. Em 2000 o controle do canal passou para o Panamá.Cássio Marcelo de Melo Tuneshttp://www.blogger.com/profile/10357923622868867785noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8380482.post-70092122460349006562007-04-01T18:35:00.000-07:002007-04-02T13:06:17.816-07:00O filme "300"<strong>“300” foi aprovado</strong><br /><br />Fui à estréia do filme “300” na sexta-feira (30 de março), no Cinemark do Píer 21, sessão de 14:30. Achei o lugar muito cheio. Alunos e alunas aos montes (parecia o exército de Xerxes). Alguns me cumprimentaram educadamente, outros não me viram e outros fingiram que não me viram. Tudo bem. Não sei se essa quantidade de alunos é normal no horário de almoço de sexta-feira ou se foi excepcional por causa da estréia do filme. De qualquer forma, embora tivesse muita gente na sessão, ela não estava lotada, ao contrário do que imaginei. Mas uma coisa me chamou a atenção: o silêncio da platéia durante todo o filme, com exceção de um momento, quando um grupo de jovens gritou “<em>This is Sparta</em>!”, acompanhando as falas do personagem central (o pior é que ficou engraçado). De resto, as pessoas pareciam estar em transe no cinema. Não sei se a maioria gostou, mas na saída ouvi um cabeludo revoltado dizendo para os amigos: “Pô véio! Ele estragou o filme!”.<br />Bem, eu gostei bastante dos “300”. Pretendo vê-lo de novo e vou comprar o DVD quando for lançado. Por que gostei? Primeiro, porque adoro filmes épicos e de guerra, principalmente se baseados em algum fato da Antiguidade. Obviamente, isso por si só não é garantia de um bom filme. Vai depender também de como o enredo foi construído, da direção, da fotografia, do figurino e da música. A fidelidade histórica não é fundamental se o objetivo do filme for o entretenimento, a diversão, a fantasia em cima do que aconteceu – uma boa estória inspirada na história. Nesse tipo de filme esses outros fatores, digamos “técnicos” e “estéticos”, acabam tendo um peso muito maior do que a fidelidade aos acontecimentos. E essa foi a segunda e principal razão de ter gostado do filme: ele é um espetáculo de imagens e sons, com boas atuações e uma estória que prende a nossa atenção. Ele não é um documentário ou um daqueles filmes com pretensões de reconstituir a história, como nas produções do Discovery Channel, da BBC ou do National Geographic. Mesmo assim, “300” é razoavelmente fiel à história e não distorceu de forma absurda os acontecimentos que o inspiraram.<br /><br /><strong>Os “300” de Frank Miller<br /></strong><br />“300” é uma adaptação de uma história em quadrinhos ou, como virou moda dizer, de uma “graphic novel”, com o mesmo título, do escritor e desenhista americano <strong>Frank Miller</strong>, lançada em 1998. Miller possui uma legião de fãs e é cultuado como uma espécie de “mestre” da sua geração de HQ. Eu acho os seus desenhos umas porcarias, chatíssimos de ver. Comprei na época os 5 números de “300”, li e joguei fora só por causa das ilustrações. Não compro mais nada ilustrado por ele e nem vou comprar. Nesse ponto sou muito mais conservador em termos de arte gráfica e prefiro desenhistas antigos como <strong>Frank Frazetta</strong> (insuperável), <strong>Hal Foster</strong>, <strong>Burne Hogarth</strong>, <strong>Joe Kubert</strong> e, vá lá, <strong>Russ Manning</strong>. O ponto forte de Miller são suas estórias, que costumam render bons roteiros para o cinema de ação (além de “300”, foram os casos de “Sin City” e “Elektra”). Acompanhados por um diretor competente, música adequada e recursos de efeitos visuais e sonoros de primeira linha, esses roteiros dão uma outra dimensão à obra de Miller, que os quadrinhos não conseguiram até hoje atingir.<br /><br /><strong>A história que inspirou os “300” de Frank Miller</strong><br /><br />A estória dos “300” de Frank Miller é uma adaptação livre de um dos episódios militares mais famosos da Antiguidade – a <strong>Batalha das Termópilas</strong>, em 480 aC, entre gregos e persas, relatado, entre outros, pelo historiador <strong>Heródoto</strong> (484-425 aC). Na época da batalha, a Grécia estava dividida em pequenos Estados independentes ou cidades-estados, como Atenas, Esparta e Tebas. A Pérsia - atual Irã - por sua vez, dominava um poderoso império no Oriente Médio. Os persas organizaram um gigantesco exército (talvez 250 mil homens) comandado pelo rei <strong>Xerxes I </strong>e invadiram a Grécia com a intenção de incorporá-la aos seus domínios. O rei <strong>Leônidas I</strong> de Esparta, chefiando um pequeno contingente de gregos - uns 6 mil, entre eles 300 espartanos, considerados os melhores guerreiros da Grécia - dirigiu-se às Termópilas (“portões de fogo”), uma passagem estreita entre as montanhas e o mar na rota da invasão persa. Sua intenção era atrasar o máximo possível os invasores enquanto os gregos organizavam suas forças de defesa. Por três dias, possivelmente no mês de agosto de 480 aC, os espartanos e os outros gregos conseguiram deter os persas que sofreram perdas terríveis tentando inutilmente romper as defesas de Leônidas. Até as tropas de elite do exército persa, conhecidas como os “Imortais”, foram repelidas para desespero de Xerxes. Contudo, um grego chamado <strong>Efialtes</strong> revelou aos persas a existência de uma trilha secreta pelas montanhas que permitiria contornar e cercar as forças gregas. Leônidas sabia da existência desse caminho alternativo e tinha previamente enviado para lá 1.000 soldados da Fócida com a missão de guardá-lo. Quando o exército persa se aproximou do local, os fócios recuaram para outra linha de defesa. Ao invés de atacá-los, os persas continuaram avançando na direção das forças de Leônidas. Percebendo o cerco iminente, grande parte dos gregos fugiu ou recebeu ordens de Leônidas para se retirar. Entretanto, Leônidas permaneceu nas Termópilas com o que restava dos 300 espartanos, de 700 soldados da Téspia (que, sob o comando de <strong>Demófilo</strong>, haviam se recusado a abandonar seus aliados) e de 400 de Tebas (forçados a ficar por ordem de Leônidas). Não sabemos o total de soldados gregos que restaram para o confronto final, mas possivelmente eram menos de mil. Na luta encarniçada que se seguiu, os dois lados combateram com fúria e coragem. Dois irmãos de Xerxes e outros membros da família real persa morreram no enfrentamento. Leônidas também foi morto e seu corpo foi disputado desesperadamente pelos espartanos e persas. No final, os espartanos formaram um bloco compacto de soldados e foram massacrados pelas flechas e dardos persas. Os téspios também foram dizimados, mas os sobreviventes tebanos acabaram se rendendo. Xerxes, que não participou diretamente dos combates e nem foi ferido, ordenou que a cabeça de Leônidas fosse cortada e seu corpo crucificado.<br />A invasão persa continuou depois dessa difícil vitória na Batalha das Termópilas. Atenas chegou a ser tomada e incendiada, mas seus habitantes tinham fugido antes da chegada dos persas. No entanto, em setembro de 480 aC a frota persa de 1200 navios foi destruída por uma esquadra grega com 380 navios, na <strong>Batalha de Salamina</strong>, onde se destacaram os atenienses sob o comando de <strong>Temístocles</strong>. E, em julho (?) de 479 AC, uma força de 80 mil gregos (5 mil espartanos), chefiada pelo rei espartano <strong>Pausânias</strong>, destroçou o exército persa de 100 mil soldados na <strong>Batalha de Platéia</strong>. Com as derrotas de Salamina e de Platéia, a invasão persa fracassou e as cidades-estados da Grécia continuaram livres. Quanto a Xerxes, em 465 aC, ele foi assassinado na Pérsia por um dos seus ministros. Em 440 aC, no reinado de <strong>Artaxerxes I</strong>, sucessor de Xerxes, o corpo de Leônidas foi devolvido aos espartanos – 40 anos depois de sua morte na Batalha das Termópilas.<br />Segundo as antigas fontes históricas, pelo menos dois espartanos sobreviveram à Batalha das Termópilas: <strong>Pantites</strong> e <strong>Aristodemus</strong>. Pantites tinha sido enviado por Leônidas à região da Tessália para recrutar mais soldados, antes da batalha começar. Ele fracassou nessa missão e quando retornou para as Termópilas, a batalha já tinha terminado e seus companheiros estavam mortos. De volta a Esparta, foi desprezado pelos espartanos por não ter participado do ato de heroísmo em Termópilas e acabou se suicidando. Aristodemus e outro espartano, <strong>Euritos</strong>, tinham ficado gravemente feridos nos olhos durante a batalha e Leônidas ordenou que ambos retornassem para Esparta. Contudo Euritos acabou voltando para as Termópilas e morreu nos combates. Aristodemus retornou para sua cidade mas como Pantites, foi menosprezado e humilhado pelos espartanos. Para tentar se redimir, lutou feito um alucinado em Platéia.<br /><br /><strong>O filme “300”<br /></strong><br />“300” tem 117 minutos e foi dirigido por <strong>Zack Snyder</strong>, com roteiro dele e de <strong>Kurt Johnstad</strong>. A maior parte do enredo de Frank Miller foi preservada. O rei Leônidas é interpretado por <strong>Gerard Butler</strong>, Xerxes por <strong>Rodrigo Santoro</strong>, a esposa de Leônidas, a rainha Gorgo, é interpretada por <strong>Lena Headey</strong> (lindíssima) e Efialtes por <strong>Andrew Tiernan</strong>. Todos esses personagens existiram, segundo as fontes antigas. Mas o filme acrescentou personagens fictícios, alguns inspirados em figuras reais. Por exemplo, o espartano Dilios (<strong>David Wenham</strong>) foi baseado em Aristodemus. Outro espartano, Stelios (<strong>Michael Fassbender</strong>), foi baseado em Dieneces que, diante da ameaça dos persas lançarem sobre os gregos tantas flechas que elas tapariam o sol, teria dito que assim seria melhor porque lutariam na sombra. Daxos (<strong>Andrew Pleavin</strong>), o guerreiro árcade, parece ter sido inspirado em Demófilo, embora no filme ele tenha fugido das Termópilas para escapar do cerco persa. O capitão espartano Ártemis (<strong>Vincent Regan</strong>) e seu filho Astinos (<strong>Tom Wisdom</strong>) são fictícios, mas podem ter sido inspirados em dois irmãos que lutaram com distinção na batalha, Alfeu e Marons. O principal vilão fictício do filme é o conselheiro espartano Theron (<strong>Dominic West</strong>).<br />O filme, assim como a história em quadrinhos repito, não tem pretensões de rigor histórico. Portanto, falar que o filme possui “erros” não seria adequado, já que esses “erros” são conscientes e propositais. O mais correto seria falar em “adaptações” ou mesmo “invenções livres”. Diversas análises foram feitas apontando essas adaptações e invenções e não vou repeti-las aqui. Para os interessados, indico os seguintes comentários disponíveis na internet, todos em inglês:<br /><br /><a href="http://en.wikipedia.org/wiki/300_(film)">http://en.wikipedia.org/wiki/300_(film)</a> – detalhes sobre o filme, sua fidelidade histórica e as críticas favoráveis e desfavoráveis em um artigo equilibrado da Wikipedia.<br /><br /><a href="http://en.wikipedia.org/wiki/Battle_of_Thermopylae">http://en.wikipedia.org/wiki/Battle_of_Thermopylae</a> - outro bom artigo da Wikipedia, tratando da Batalha das Termópilas.<br /><br /><a href="http://www.chasingthefrog.com/reelfaces/300spartans.php">http://www.chasingthefrog.com/reelfaces/300spartans.php</a> - um ótimo “fato e ficção” do filme.<br /><br /><a href="http://www.iranian.com/Daryaee/2007/March/300/index.html">http://www.iranian.com/Daryaee/2007/March/300/index.html</a> - uma visão negativa e pró-persa do filme.<br /><br /><a href="http://www.thestar.com/article/190493">http://www.thestar.com/article/190493</a> - outro artigo desfavorável ao filme, criticando sua pouca precisão histórica.<br /><br /><a href="http://www.victorhanson.com/articles/hanson032807.html">http://www.victorhanson.com/articles/hanson032807.html</a> - uma defesa convincente do filme.<br /><br /><a href="http://www.perseus.tufts.edu/">http://www.perseus.tufts.edu/</a> - textos antigos sobre a Batalha das Termópilas e os personagens reais retratados no filme.<br /><br />Se vocês tiverem paciência, leiam esses artigos depois dos meus comentários ao final dessa postagem.<br />Por fim, como já falei em outra postagem, vejam a versão mais antiga da Batalha das Termópilas no filme <strong>“Os 300 de Esparta”</strong> (“<em>The 300 Spartans</em>”), disponível em DVD. Ele é uma produção de 1962, dirigida por <strong>Rudolph Maté</strong>. <strong>Richard Egan</strong> faz o papel de Leônidas, <strong>David Farr</strong>ar representa Xerxes e <strong>Ana Synodiou</strong> é Gorgo. Embora sem os recursos técnicos do “300” mais recente, o filme de Maté é muito mais fiel aos acontecimentos. Parece que Frank Miller resolveu escrever sua estória inspirada nesse filme de 1962.<br /><br /><strong>A violência e o preconceito cultural dos “300”<br /></strong><br />“300” é um filme violento (se não me engano ele é proibido para menores de 16 anos) que opõe de forma maniqueísta os gregos (símbolos da liberdade) aos persas (símbolos da opressão). Ele vem sendo muito criticado por isso, com alguns dizendo que é uma apologia à violência e ao fascismo (irracionalismo militarista ultra-nacionalista), além de ser uma propaganda ideológica contra o Oriente de uma maneira geral e à Pérsia, quer dizer, ao Irã, de forma particular. Segundo esses críticos, o filme induz o espectador a legitimar e a valorizar a violência e a considerar o Irã-Pérsia uma ameaça ao Ocidente.<br />Bem, o filme retrata uma batalha, onde um grupo de guerreiros foi dizimado por outro. Como não ser violento?<br />A batalha ficou famosa pelo heroísmo dos gregos, sobretudo pelo senso de dever e sacrifício coletivo pela pátria e por valores políticos considerados dignos de luta – coisas que, no mundo atual, cada vez mais individualista, consumista, cínico e amoral, são vistas por muitos como ultrapassadas, anacrônicas, absurdas ou simplesmente ridículas. No nosso mundo, exigem-se cada vez mais direitos, mas os deveres são desprezados, ironizados e orgulhosamente descumpridos. Assim como interpretar sob o ângulo dos “valores” dominantes de hoje, o que aconteceu nas Termópilas?<br />A sociedade espartana era altamente militarizada. Os espartanos formavam uma elite de cidadãos que eram soldados profissionais, submetidos a uma rigorosa disciplina e treinamento desde crianças, proibidos de exercerem outras atividades até os 60 anos. Esse tipo de profissionalismo militar não era comum nas cidades-estados gregas. De fato, os cidadãos das outras cidades, como Atenas, eram agricultores, artesãos e comerciantes que só pegavam em armas em tempos de guerra. O serviço militar era um dever cívico desses cidadãos, que tinham de se armar com seus próprios recursos. Assim, seus exércitos não eram permanentes e profissionais como os de Esparta eram na verdade, uma espécie de “milícia” de cidadãos-soldados. Por essa razão, os guerreiros espartanos se destacaram em relação aos demais guerreiros gregos. Ainda assim, mesmo sem o grau de especialização, treinamento e eficiência dos espartanos, os exércitos não-profissionais das outras cidades gregas constituíram uma terrível máquina de combate. Na verdade, o conjunto dos guerreiros gregos, incluindo obviamente os espartanos, foram os melhores do mundo antigo em 550-350 aC, como os persas descobriram. Como não destacar esse militarismo “fora de moda” num filme sobre guerreiros gregos, sobretudo espartanos?<br />O filme e o fato que o inspirou têm sim muito de sanguinolento, de apologia à força bruta, de instinto animalesco do enfrentamento físico e brutal entre rivais – aquilo que antigamente era chamado de “filme de macho”. Esse aspecto irracional, tão fundamental nas origens das guerras e da violência de uma maneira geral, é incompreensível para muitos, sobretudo, para os que acreditam que o homem é naturalmente bom e pacífico e que todo ato violento tem causas exclusivamente sociais ou econômicas isto é, em distorções estruturais da sociedade. Como, sob esse ângulo, compreender o prazer em lutar e matar retratado no filme?<br />A questão se torna mais complexa quando lembramos que a sociedade grega foi muito mais violenta do que a sociedade moderna capitalista e, ainda assim, inovadora e revolucionária no campo cultural. Os gregos utilizaram-se amplamente da escravidão, freqüentemente o “comércio” grego confundia-se com a pirataria e as guerras eram quase endêmicas entre suas cidades-estados. Contudo, essa violenta civilização foi a mesma que criou e nos legou a filosofia, os fundamentos da ciência moderna, da indagação racional e da ciência política. As bases da literatura, das artes plásticas e do teatro do Ocidente foram inventadas pelos antigos gregos, enquanto exploravam de forma brutal o trabalho de outros seres humanos e se matavam em constantes guerras. Como uma civilização guerreira pôde lançar as bases de uma cultura humanista?<br />Em geral, as cidades-estados gregas ou póleis possuíam regimes republicanos com governos eleitos pelos cidadãos isto é, pelos indivíduos com direitos e deveres políticos. Mesmo em Esparta, onde existia uma monarquia dual ou diarquia (dois monarcas simultaneamente) com poder reduzido, os principais magistrados eram os éforos, eleitos pelos cidadãos-soldados com mandato anual. Em todas as póleis com governos representativos existiam assembléias de cidadãos e órgãos consultivos que controlavam e limitavam o poder executivo. Dependendo da quantidade de cidadãos com plenos direitos, a cidade-estado assumia a forma de uma oligarquia (um “governo de poucos” ou da aristocracia, isto é, das famílias da nobreza, como em Esparta) ou de uma democracia (o “poder do povo” quer dizer, do conjunto de cidadãos, incluindo nobres e pessoas comuns, como em Atenas). Embora os cidadãos constituíssem sempre uma minoria da população adulta (as mulheres não possuíam direitos políticos e uma parte considerável dos trabalhadores era formada por escravos), ainda assim, a simples existência da noção e da prática da cidadania, bem como a concepção de Estado, de liberdade e de igualdade que implicavam, representaram um fato inédito nas civilizações antigas. Como deixar de retratar esses valores num filme ambientado na Grécia Antiga?<br />Em contraste com a Grécia, no Oriente Médio o Estado assumiu feições mais absolutistas ou despóticas consolidadas na monarquia do reino da Pérsia que, no século VI aC, dominou grande parte da Ásia Ocidental e o Egito, formando o poderoso Império Persa. O imperador persa tinha o título de xá ou, mais precisamente, <em>xšāyaθiya xšāyaθiyānām</em> – “rei dos reis”. O título indica as pretensões universalistas e imperialistas da monarquia persa, fato que se refletiu na política de expansão territorial e de domínio sobre vários povos. De fato, os habitantes do império não eram cidadãos, eram súditos. O Estado persa não era fundamentado em assembléias e conselhos de cidadãos ainda que o xá precisasse, para governar, do apoio da família real, dos membros da nobreza e, principalmente, da burocracia imperial. Caso a Grécia caísse sob o domínio dos persas, o potencial de desenvolvimento das tradições de cidadania, de governos representativos, de liberdade de discussão e da indagação filosófica seria sufocado, com efeitos desastrosos para a formação da civilização ocidental. Isso não é especulação e nem preconceito cultural, mas uma conclusão a partir das evidências que possuímos. No século VII aC, a vanguarda política e intelectual da civilização grega estava com as póleis estabelecidas em séculos anteriores na Ásia Menor (atual Turquia). Depois que o Império Persa conquistou essas cidades-estados no século VI aC, elas perderam essa liderança cultural e passaram a ter um papel mais marginal no desenvolvimento da civilização grega.<br />Na verdade, a visão de que a guerra entre gregos e persas representou um confronto entre a liberdade política e a servidão não foi criada por nós, mas pelos próprios gregos que sabiam muito bem o que tinha acontecido e o que estava acontecendo nas terras do leste. É claro que essa avaliação dos gregos precisa ser posta à crítica histórica. Em grande medida ela foi e chegou a conclusões parecidas com a dos gregos. Acontece que da década de 1970 para cá, essa interpretação passou a ser considerada ideológica por muitos historiadores e vem sendo cada vez mais combatida. Atualmente, é considerado “politicamente incorreto” falar em tradição despótica do Oriente em oposição à tradição de liberdade do Ocidente. Quem mais condena esse tipo de comparação, considerada preconceituosa, são os chamados multiculturalistas. Sob o argumento de que todas as criações culturais devem ser respeitadas, de que nenhuma cultura é melhor ou superior à outra e de que todas têm o mesmo valor histórico, muitos multiculturalistas ou relativistas culturais acabaram se tornando antiocidentais. Afirmam que destacar os valores gregos ou ocidentais é uma postura preconceituosa e ideológica, que precisa ser evitada e banida das análises históricas, sobretudo as comparativas. Assim, para encobrir as realizações políticas e culturais da Grécia, esses historiadores antiocidentais destacam o caráter limitado da cidadania antiga, a prática da escravidão e a submissão das mulheres, ou seja, enfatizam aquilo que consideraríamos os aspectos mais negativos da civilização grega. No final, essa postura antigrega, antiocidental e multiculturalista é que se tornou ideológica e preconceituosa. Como fazer uma “leitura” da tradição grega difundida no filme “300” sob esse prisma ideológico e antiocidental?<br />Na verdade, se o filme “300” não retratasse a violência, os valores gregos e a oposição entre seus costumes e os dos persas, ele seria muito mais impreciso historicamente – muito mais ficção do que história.<br />“Ahuu"!Cássio Marcelo de Melo Tuneshttp://www.blogger.com/profile/10357923622868867785noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-8380482.post-91838701147324136522007-03-18T15:47:00.000-07:002007-03-18T15:57:15.669-07:00Os 300 de Esparta (1)Leiam a crítica de <strong>Reinaldo José Lopes</strong> sobre o filme <strong>"300"</strong> no portal G1. Tentei copiá-la neste blog, mas não cosegui (acho que o G1 tem algum tipo de proteção para impedir cópias). De qualquer forma, o endereço é: <a href="http://g1.globo.com/Noticias/0,,MUL11853-5603,00.html">http://g1.globo.com/Noticias/0,,MUL11853-5603,00.html</a>.<br /><br />Procurem também assistir ao filme <strong>"Os 300 de Esparta"</strong>, de 1961, do diretor Rudolph Maté, com Richard Egan no papel do rei Leônidas. Ele foi lançado em DVD pela Classicline em 2005.Cássio Marcelo de Melo Tuneshttp://www.blogger.com/profile/10357923622868867785noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8380482.post-42779114130766280742007-02-08T08:52:00.000-08:002007-02-08T08:57:19.581-08:00América Latina XX-XXI (1)A reportagem de capa da revista <strong>Veja</strong> de 28 de outubro de <strong>1970</strong> tratou do futuro da esquerda latino-americana. Compare o contexto analisado na época com o atual:<br /><br /><strong>Esquerda na América 28 de outubro de 1970</strong><br /><br /><strong>O que dizia a </strong><a href="http://vejaonline.abril.com.br/notitia/servlet/newstorm.ns.presentation.NavigationServlet?publicationCode=1&pageCode=1269&textCode=123435"><strong>reportagem de VEJA</strong></a><strong><br /></strong><br />Com a confirmação, pelo Congresso Nacional, do nome do marxista Salvador Allende para a Presidência do Chile, a América Latina passa a testar se outros tempos, tempos incertos de esquerda, estão de fato se iniciando. No mesmo momento, Peru e Bolívia se afundam progressivamente na linha "nacionalista de esquerda" – de desfecho ainda nebuloso. No Peru, militares liderados pelo general Juan Velasco Alvarado nacionalizaram a empresa petrolífera americana IPC, passaram a repensar o tratamento oferecido a empresas estrangeiras e comandaram a reforma agrária e o controle à imprensa. No campo externo, porém, Lima evita o reatamento com Cuba, ao mesmo tempo em que tenta se reaproximar dos Estados Unidos. Na Bolívia, o general Juan José Torres não foi muito além do reconhecimento do mérito do modelo peruano. Torres parece igualmente decidido a evitar qualquer passo mais radical. Mas é mesmo no Chile que a América Latina vê a sua maior transformação: um Chile socialista teoricamente teria condições de exercer na América Latina, a curto prazo, uma influência que Cuba não conseguiu ter em seus onze anos de fidelismo.<br /><br /><strong>O que aconteceu depois</strong><br /><br />A maior parte dos países da América Latina mergulhou em ditaduras nos anos seguintes à reportagem de VEJA. Curiosamente, os regimes fortes não seriam de esquerda, mas, sim, uma reação ao risco comunista. O Chile talvez seja o maior exemplo disso. O regime socialista do país deixou o Palácio La Moneda, sede do governo, juntamente com o corpo de Salvador Allende, em 1973: mortalmente ferido por um golpe militar comandado pelo general Augusto Pinochet. Durante os 17 anos seguintes, Pinochet comandaria o país, sepultando o sonho socialista e introduzindo reformas profundas e modernizantes na economia. Com a saída do general, em 1990, governos civis democraticamente eleitos se revezaram no poder. Isso inclui administrações socialistas como a da atual presidente, Michelle Bachelet, que chegou a ser presa e torturada durante a era Pinochet.<br />Ao invés da "nacionalização esquerdizante" de que falava a reportagem de VEJA de 1970, os atuais socialistas chilenos têm se esforçado em manter a estabilidade econômica, ampliar ganhos de produtividade e multiplicar investimentos em áreas como educação e tecnologia. O resultado disso é que a economia chilena é a que mais cresce no bloco latino-americano, com taxas constantes ao redor dos 5% ao ano. Os benefícios são comprovados pelos indicadores sociais: os chilenos têm taxas de analfabetismo, homicídio e desemprego abaixo da média regional; já o PIB per capital está acima do dos vizinhos.<br />Já o Peru voltou ao regime democrático em 1980. A partir de 1990, o país passou por um período de reformas liberais, comandadas pelo presidente Alberto Fujimori – "El Chino", como era jocosamente chamado devido à origem oriental. Apesar do início promissor, Fujimori despertou o populismo típico do continente: fechou o Congresso, reformou a Constituição para ser reeleito e pretendia se perpetuar no poder. Só foi impedido porque denúncias graves de corrupção o afastaram do poder. Desde então, o Peru divide seu tempo e energia entre propostas de salvação nacional e novas denúncias de corrupção.<br />A Bolívia, terceiro personagem da capa de VEJA de 1970, parece ter feito uma viagem ao passado. Eleito em 2006, o presidente Evo Morales, determinou o monopólio estatal dos negócios do gás e do petróleo. Sem aviso prévio, mandou o Exército invadir refinarias de propriedade de empresas estrangeiras – uma das maiores prejudicadas pela ação foi a brasileira Petrobras, que investira bilhões de dólares no país vizinho. É a terceira vez que a Bolívia estatiza seus recursos fósseis e minerais. Nas duas anteriores, em 1937 e 1969, a intervenção não ajudou o país a amenizar a miséria de seu povo e, por isso, acabou sendo revertida. No plano doméstico, Morales trava duras batalhas com a oposição para reformar a Constituição nacional e ampliar mudanças rumo a um suposto “socialismo”. Seu grande mentor neste tema – e também na questão da nacionalização do gás e do petróleo – é o venezuelano Hugo Chávez.<br />Curiosamente, a Venezuela não foi tragada pela onda de regimes militares que assolou a América Latina nos anos de 1960 e 1970. Porém, em pleno século XXI, o país caminha em direção a uma ditadura personalista, concentrada nas mãos de um presidente eleito democraticamente. Hugo Chávez é o cacique dos novos populistas latino-americanos. Caudilho de tradição caribenha, ele usa o lucro farto do petróleo venezuelano para alimentar uma política doméstica assistencialista e financiar aliados nos países vizinhos – caso de Morales, na Bolívia, Rafael Correa, no Equador, e Daniel Ortega, na Nicarágua. Além disso, ele viaja pelo mundo repetindo pregações contra o "inimigo dos oprimidos", os Estados Unidos, numa tentativa de ressuscitar a antiga tática da esquerda de eleger um adversário e atribuir a ele todos os males domésticos. A divisão na América Latina, porém, nada tem a ver com o velho confronto entre esquerda e direita. O que existe é uma linha entre governos responsáveis e populistas. México, Chile e Brasil estão no primeiro grupo. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva manteve os fundamentos de estabilidade econômica herdados do governo anterior e não tenta subverter as regras do jogo político para se tornar um ditador. A inflação é baixa, e os investimentos externos estão aumentando. Já do lado dos populistas, uma característica comum é revestir o discurso com retórica de esquerda: é o caso de Chávez, Morales e, em menor medida, ao argentino Néstor Kirchner.Cássio Marcelo de Melo Tuneshttp://www.blogger.com/profile/10357923622868867785noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8380482.post-32818339944164570702007-02-07T17:24:00.000-08:002007-02-07T17:28:30.888-08:00Donald Kagan e as guerras<div align="justify"><br /><strong>Donald Kagan</strong> é um historiador americano de origem lituana nascido em 1932. Professor de História da Grécia Antiga na Universidade de Yale, Kagan escreveu um notável estudo sobre a Guerra do Peloponeso em quatro volumes, publicado em 1969-1987. Embora uma versão resumida dessa obra tenha sido lançada no Brasil em 2006 (<em>A Guerra do Peloponeso</em>, Editora Record), seus trabalhos são poucos conhecidos ou discutidos aqui. O mesmo ocorre com os escritos do seu filho, Robert Kagan (nascido em 1958), um destacado analista político, que tem um pequeno mas excelente ensaio traduzido para o português (<em>Do Paraíso e do Poder – Os Estados Unidos e a Europa na Nova Ordem Mundial</em>, Editora Rocco, 2003). Donald Kagan também é autor de um livro formidável sobre as origens das guerras – <em><strong>On the Origins of War and the Preservation of Peace</strong></em> (Anchor Books, 1996). Nesse livro, Kagan analisa as origens da Guerra do Peloponeso, da Segunda Guerra Púnica, da Primeira Guerra Mundial, da Segunda Guerra Mundial e da Crise dos Mísseis de Cuba, que quase desencadeou a Terceira Guerra Mundial. Na Introdução desse estudo, ele faz algumas reflexões sobre o poder e sua projeção internacional sob a ótica da teoria realista. Um resumo dessa Introdução, com adaptações, segue abaixo:<br /><br /><strong>1. O fim das guerras mundiais?</strong><br /><br />O colapso da URSS em 1991 encerrou a perigosa rivalidade bipolar de 50 anos. Para muitos analistas, esse acontecimento inaugurou uma nova era de segurança, prosperidade e paz, resultado da vitória do Ocidente sobre o Leste, da democracia sobre a ditadura comunista, do livre mercado sobre o dirigismo econômico. Uma paz duradoura agora seria possível porque: (I) a expansão do livre mercado e das comunicações, integrando economicamente os países no processo de globalização, tornaria improvável ou impossível uma grande guerra entre as potências; (II) a extensão da democracia pelo mundo tornou-o mais pacífico, haja vista que as democracias não lutaram entre si na modernidade; (III) a nova balança do poder deixou as potências satisfeitas com o seu lugar no mundo; (IV) a existência dos arsenais nucleares, com capacidade de retaliação, impedem guerras generalizadas entre grandes potências; (V) o triunfo do liberalismo sobre o socialismo encerrou os grandes conflitos ideológicos.<br />Mas esse otimismo existiu no passado em outras conjunturas, como no final do século XVIII, no século XIX e no início do século XX, quando também se dizia que o comércio e os regimes representativos seriam barreiras contra as guerras. Contudo, em 1792-1815, todas as grandes potências da Europa foram envolvidas nas guerras da Revolução Francesa e da Era Napoleônica, e em 1914-1918, todas as grandes potências industriais lutaram na Primeira Guerra Mundial.<br /><br /><strong>2. O otimismo pacifista ocidental <br /></strong><br />Um aspecto cultural fundamental do Ocidente moderno é a crença de que os seres humanos podem modificar e controlar o ambiente físico ou natural e a natureza humana para melhorar as condições de vida. Essa crença tem sua origem na (I) Revolução Científica dos séculos XVI-XVII, que iniciou a crença de que a natureza poderia ser manipulada com esse propósito, e na (II) Revolução Intelectual do século XVIII (o Iluminismo), que desenvolveu a idéia de que a sociedade e o comportamento do indivíduo poderiam ser adaptados para criar o progresso, a paz e a prosperidade. Como a natureza, os povos e as instituições foram vistas como infinitamente maleáveis, exigindo apenas inteligência, boa vontade e determinação para serem aperfeiçoadas.<br /><br /><strong>3. O grande equívoco</strong><br /><br />A idéia de que a “Era das guerras entre as potências” acabou foi ou é defendida por otimistas (argumento das vantagens do comércio e da democracia) e por pessimistas (argumento do temor da destruição mútua). No entanto, esse raciocínio ou conclusão está errado. Esperando e acreditando no progresso, ambos esqueceram que a guerra faz parte da experiência humana desde tempos pré-históricos. Em 1968, Will e Ariel Durant calcularam que houve apenas 268 anos livres de guerras nos 3421 anos anteriores. Os antigos gregos tinham consciência da constância da guerra. Ao contrário deles, no entanto, o mundo moderno falhou em compreender as causas da guerra. Nossa época procurou as causas e origens das guerras em forças impessoais: (I) na monarquia, aristocracia e a antiga índole guerreira que as envolvia; (II) na luta de classes; (III) no imperialismo; (IV) na corrida armamentista: (V) no sistema de alianças etc.<br /><br /><strong>4. Poder<br /></strong><br />Os estudiosos modernos mais astutos concluíram que algo mais fundamental gera as guerras: a competição pelo poder. O ilustre historiador Michael Howard, no livro <em>The Causes of War</em> (1983),observou que “em 1914 a maioria dos alemães, e em 1939 quase todos os britânicos, sentiram-se justificados a irem à guerra não por causa de alguma questão específica que poderia ser resolvida pela negociação, mas para manter o seu poder antes que ficassem isolados, tão impotentes, que não lhes restaria nenhum poder e teriam que aceitar uma posição subordinada dentro de um sistema internacional dominado por seus adversários.”<br />Mas o que é o poder? Poder é a habilidade de impor a sua vontade sobre outro, em geral pela força. Isso não é necessariamente ruim porque o poder é em si neutro. Na verdade, poder é a capacidade de atingir fins desejados, bons ou maus. Ele também é a capacidade de resistir às exigências e pressões de outros. Nesse caso, o poder é fundamental para se obter e preservar a liberdade.<br /><br /><strong>5. Realismo e neo-realismo</strong><br /><br />O poder no nosso mundo é essencial e a disputa por ele é inevitável. Esse ponto de vista é básico entre os cientistas políticos modernos realistas e neo-realistas que estudam as relações internacionais. Os realistas acreditam que todos os Estados e nações buscam o máximo de poder possível. Para eles, o conflito gerado pela busca ilimitada do poder só termina quando uma potência domina todas as outras ou quando o medo recíproco gera uma paz. Os neo-realistas afirmam que os Estados buscam não o poder em si ou a dominação, mas a segurança que, por sua vez, requer poder. Eles têm uma visão menos assustadora porque deixam a esperança de que sistemas podem ser construídos e pessoas educadas de maneira a controlar o poder, fornecendo segurança a todos sem uma luta interminável, embora nenhum sistema tenha alcançado isso ainda. Para os neo-realistas, os Estados buscam o poder para preservar as coisas boas que eles possuem na paz e na segurança.<br />A maioria dos estudiosos dessa questão assume que os Estados buscam o poder para alcançar objetivos práticos e tangíveis: riqueza, prosperidade e liberdade de interferência externa. Mas a extensão dos objetivos que levam um povo a ir à guerra é muito ampla e nem sempre tão prática. De acordo com Geoffrey Blainey (<em>The Causes of War</em>, 1973), as causas das guerras são variedades do poder: nacionalismo, expansão ideológica, proteção de povos irmãos em terras adjacentes, desejo de mais comércio e territórios, vingança de uma derrota ou insulto, fortalecimento nacional ou independência, desejo de impressionar ou cimentar alianças. Mas a lista não unicamente de variedades do poder, mas também inclui objetivos pelos quais se procura o poder.<br /><br /><strong>6. Tucídides<br /></strong><br />Tucídides, o antigo historiador grego, forneceu uma explicação clara, mais profunda e compreensiva das razões dos Estados guerrearem: ele entendeu que era competição armada pelo poder. No seu famoso livro, <em>História da Guerra do Peloponeso</em>, no igualmente famoso trecho do Diálogo Meliano, os atenienses afirmam que a busca ilimitada do poder é natural, tanto nos céus como na terra. Segundo Tucídides, as pessoas vão à guerra pela “honra, medo e interesse”. Que o medo e interesse causam guerras não surpreende o leitor moderno, mas o papel da honra pode soar estranho. Se entendida como fama, glória, renome ou esplendor, parece coisa do passado, anacrônica. No entanto, entendida como respeito, estima, dever justo, consideração ou prestígio é um importante motivo das guerras no mundo moderno. Nesse sentido, ela é desejável em si mesma, mas também de importância prática na competição por poder. Quando o poder de um Estado aumenta, o respeito e deferência por ele crescem. Mas mesmo quando o seu poder material aparenta continuar o mesmo, na realidade ele declina se as atitudes acerca dele mudarem. Isso acontece mais frequentemente quando um Estado perde a vontade de usar o seu poder material.</div>Cássio Marcelo de Melo Tuneshttp://www.blogger.com/profile/10357923622868867785noreply@blogger.com1